Mesa de abertura da Convenção: Pedro Monzon, Anita Prestes, Leonel Brizola, Eliomar Coelho e Antonio Mata | Foto: InterTelas |
A reforma constitucional cubana, o fim do bloqueio econômico imposto pelos Estados Unidos, os novos rumos do socialismo no país e o cenário internacional conflituoso que se desenha na América do Sul foram o foco de debate nos dias 26 e 27 de abril, durante a XI Convenção Estadual de Solidariedade a Cuba, promovida pela Associação Cultural José Martí do Rio de Janeiro (ACJM-RJ), Casa de Amizade Brasil-Cuba.
Na sexta-feira passada, o evento iniciou os seus trabalhos com a comemoração dos 60 anos da Revolução Cubana, no auditório da Câmara Municipal do Rio de Janeiro. O evento foi recebido pela casa legislativa através da iniciativa do vereador da cidade do Rio de Janeiro pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) Leonel Brizola Neto, em conjunto com a ACJM-RJ.
Na ocasião, além do vereador, a mesa de abertura foi composta pelos seguintes palestrantes convidados: o cônsul-geral de Cuba em São Paulo Pedro Monzon Barata, o conselheiro de imprensa do Consulado Geral de Cuba em São Paulo Antonio Mata Salas, o deputado estadual pelo PSOL Eliomar Coelho, a historiadora Anita Prestes e o matemático Carlos Gustavo Moreira, presidente da Associação José Martí.
Durante a exposição de Antonio Mata Salas foi apresentada uma síntese sobre a história da ilha desde a ditadura de Fulgencio Batista, a luta armada, a vitória em 1959 e as mudanças políticas, econômicas e sociais provocadas pelo modelo socialista em suas diferentes fases, relatando conquistas e desafios até os dias atuais.
Na explanação do também professor da Universidade de Havana sobressaiu-se a ideia de que a construção de uma sociedade com alicerces diferentes dos estabelecidos por uma sociedade capitalista, cuja estrutura de poder é baseada na democracia liberal burguesa, de representação partidária, não foi uma tarefa fácil. Em um sistema internacional, em que o centro de poder localiza-se desde o fim da Segunda Guerra Mundial em Washington, capital dos Estados Unidos, a ordem estabelecida é de que países como Cuba, assim como os demais da América Latina, devem permanecer sob o controle do governo estadunidense.
É por esta e outras razões que o governo socialista cubano sofre, desde a sua constituição, constantes ameaças e pressões que historicamente registram a realização de tentativas de invasão, inúmeros planos de assassinato a Fidel Castro, e, acima de tudo, a desestabilização e bloqueio de Cuba, com um embargo econômico que perdura até os dias de hoje. Por isso, uma das questões bastante salientada na Câmara foi o novo cenário interno que se desenha na ilha atualmente, em razão da reforma constitucional, cujas propostas foram votadas pelos cubanos através de um referendum.
É importante ressaltar que com a chegada do século XXI e o novo cenário que se forma no quadro internacional, fez-se necessário para os cubanos novamente reavaliarem os rumos futuros de sua estrutura política, econômica e social, adaptando sua proposta socialista aos novos tempos. Desta forma, após a morte de Fidel Castro, as mudanças promovidas por Raúl Castro, durante seu período como presidente do Conselho de Estado, cargo que ocupou temporariamente após a morte de Fidel e assumiu com plenos poderes de 2008-2018, e que são continuadas por Miguel Díaz-Canel, presidente de Cuba, eleito em 19 de abril de 2018, incitam novas discussões que, na realidade, fazem parte do debate mundial mais amplo, atualmente promovido pela esquerda, sobre o futuro do socialismo.
Na oportunidade, foi evidenciado a volta de Cuba ao centro do cenário internacional, com a tentativa de retomar relações diplomáticas com os Estados Unidos, uma iniciativa que segue os preceitos da já tradicional política externa independente cubana. Com o objetivo principal de promover o fim do bloqueio econômico e dar suporte aos países que também fazem parte da lista de “inimigos” dos Estados Unidos (Venezuela, Coreia do Norte, Rússia, Irã, China, Síria e outros), Cuba mais uma vez acaba por destacar-se como um ator que busca frear a atuação impositiva dos norte-americanos de interferir em assuntos internos de países soberanos.
Segundo o cônsul Pedro Barata, a administração Barack Obama foi bastante perspicaz e estratégica ao tentar buscar uma reaproximação com a ilha, em um período que efetivamente uma fase mais próspera na história das relações externas entre norte-americanos e cubanos pode finalmente ser vislumbrada. Contudo, o diplomata salientou que mesmo em um cenário mais positivo, os Estados Unidos continua obtendo grande desconfiança de Cuba, a medida que permanece com uma política inclinada não apenas em querer tornar inviável a presença de uma país socialista na América Latina, como também busca infligir no direito de autodeterminação dos povos, sendo uma ameaça à soberania de Cuba e sua independência.
Nesta mesma linha, o deputado estadual Eliomar Coelho fez questão de relembrar sobre a Frente Parlamentar que presidiu no Rio de Janeiro, no intuito de angariar apoio ao restabelecimento das relações diplomáticas entre os dois países. Apesar das dificuldades, o deputado salientou as conquistas sociais de Cuba, que possui os melhores indicadores sociais da América Latina e do mundo, em alguns casos, além de valorizar a escolha do país em propagar em várias regiões do mundo ações humanitárias, que auxiliam países em crises.
A administração de Donald Trump, além de recuar em diversas medidas que visavam uma aproximação com Cuba e o fim do bloqueio econômico, traz uma preocupação maior ao mundo, pois se trata de uma das forças motrizes que incitam a volta da extrema-direita ao poder no cenário internacional. Esta questão foi bastante destacada pela historiadora Anita Prestes que focou também sua atenção para o Brasil, enfatizando que é preocupante o rumo escolhido pelo governo de Jair Bolsonaro, podendo resultar no fim da democracia brasileira e até a uma participação do Brasil na desestabilização da Venezuela, resultando em uma profunda crise política na América do Sul. A administração atual que impulsiona uma visão bastante distorcida sobre o socialismo e sobre países como Cuba e a Venezuela preocupa pelo ódio que propaga.
Por esta razão, o vereador Leonel Brizola Neto afirmou que se faz necessário eventos esclarecedores sobre a situação destes países, possibilitando à população brasileira ter acesso a outras fontes de informação e a compreender, sobre outras perspectivas, as realidades destas nações. Isso ocorre também pela falta de uma mídia mais democrática, como salientou Raphael Assis do jornal “A Verdade”, durante o segundo dia de atividades da convenção, que ocorreu em 27 de abril, no Sindicato de Telefonia do Rio de Janeiro (Sinttel). Para o também ativista, uma mídia que promova a pluralidade de opiniões, informação e incite, consequentemente, a consciência politica de forma mais ampla da população, ainda é uma realidade distante no Brasil e está sob ameaça com o governo Bolsonaro.
Raphael Assis, Maria José Latgé (ACJM-RJ), Antonio Mata e Carlos Gustavo Moreira (ACJM-RJ) | Foto: InterTelas |
Nesta oportunidade, o professor relata em mais detalhes as mudanças que o modelo socialista cubano irá sofrer com a recente reforma constitucional aprovada no país. Ainda neste sábado, os participantes puderam desfrutar de um almoço mexicano oferecido pelo Movimento de Mulheres Olga Benário e também lideranças e membros de várias entidades, associações, movimentos, professores, pesquisadores, especialistas e demais participantes realizaram pronunciamentos em apoio à Cuba, à Venezuela e à luta global por justiça social e igualdade.
Convenção Nacional de Solidariedade a Cuba - 2019
Convenção Nacional de Solidariedade a Cuba - 2019
6⃣0⃣Revolução Cubana 🇨🇺🇧🇷 Em Junho, Convenção de Solidariedade a Cuba em Santos. Vamos nessa? Com a presença do criador do Mais Médicos @padilhando, do presidente do ICAP @Fernando5hCuba, do economista @NildoOuriques e do jornalista @noucaute.— Solidários a Cuba (@blogsolidarios) 24 de abril de 2019
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