O Blog Solidários publica a seguir série de reportagens produzidas pelo enviado a Havana Luís Fernando e publicadas no jornal angolano "O País". Aprecie:
Que peso têm os do contra?
Os activistas com ânimo e suficiente coragem para se oporem à política oficial na Ilha lá andam, é certo, mas com um desempenho que a maioria dos cubanos que transita pelas ruas sequer conhece.
É a prova de que o seu estardalhaço tem mais de amplificação mediática no estrangeiro que de peso real na tentativa de desequilibrar a velha ordem estabelecida desde que Fulgêncio Baptista se esgueirou para Norte, em busca do sossego liquidado na terra que parecia governar por procuração americana.
As greves de fome, os panfletos e as tentativas de conspiração localizadas parecem um jogo de aprendizes que ninguém leva a sério num país conhecido pela omnipresença dos serviços de segurança, onde os cidadãos têm as vidas e os passos escrutinados pelos vizinhos no espírito funcional dos chamados Comités de Defesa da Revolução (CDR), uma espécie de ODP dos tempos do Poder Popular por cá.
Da acção dos que se rebelam contra as autoridades, os jornais – todos de capitais públicos – não falam nem bem nem mal. São olimpicamente ignorados, mesmo que façam manchetes em Espanha quando o poder decide transigir e os deixa partir para longe, num exercício de diplomacia que a União Europeia quase sempre entende como estrondoso triunfo mas que, intramuros, não passa de uma válvula de escape que se abre.
Os cubanos não têm tradição de conspirar contra Fidel Castro e tudo o que ele representa. Podem em surdina ou até de forma audível criticar o que tenha feito ou deixado de fazer, mas é sempre dentro de um contexto com o líder histórico presente que circunscrevem as suas queixas. Ou seja, adoptaram desde cedo a postura segundo a qual “a roupa suja lava-se em casa”.
Qualquer conhecedor honesto da realidade cubana admite sem esforço que a voz dos chamados políticos da oposição não tem peso dentro da Ilha, pelo que descontentes e desiludidos que o são de verdade – o general Rafael Del Pino, que protagonizou uma fuga espectacular em 1986, é um deles – procuram solo norte americano para de lá atacarem, de costados bem resguardados, o que acham inadmissível da governação em Havana.
Há até uma espécie de brincadeira inocente para certos casos, como o de escritores que enveredam por uma linha de críticas ácidas contra o sistema. Pedro Juan Gutiérrez, por exemplo, é um brilhante romancista que escreveu pérolas como El Rey de La Habana ou Trilogia Suja de Havana, onde esventra com um sarcasmo quase bíblico o duro quotidiano dos cubanos por faltar-lhes o grandioso e o trivial.
À primeira vista, pode pensar-se ou que se encontre a mofar numa cela ou que viva exilado nalgum recanto da Europa. Mas não: vive mergulhado no meio dos problemas com que arma as suas histórias de um realismo sujo, em pleno coração de Havana. Ninguém o persegue. Simplesmente os seus livros não circulam em Cuba.
Outra surpresa é Leonardo Padura, jornalista que se fez escritor e ganhou fama com livros como Passado Perfeito, Ventos de Quaresma, Máscaras e Paisagem de Outono, em que não é brando com o sistema. Continua a residir em Cuba, em total liberdade, e é tão só o romancista mais vendido no país.
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