Explosão do navio francês La Coubre pela CIA, em 1959 | Foto: Granma |
Por Jean-Guy Allard no Granma
Apesar das repetidas denúncias de Cuba acerca da responsabilidade da Agência Central de Inteligência (CIA) estadunidense na explosão, em 4 de março de 1960, do navio francês La Coubre no porto de Havana, o governo dos Estados Unidos, cinquenta anos depois, continua sequestrando os documentos de seus arquivos.
O fato foi confirmado em 26 de fevereiro último quando, em resposta a um pedido de informação, funcionários dos Arquivos Nacionais de Segurança, um projeto não-governamental de investigação acadêmica da Universidade George Washington, confirmaram que não dispõem de documentos sobre o tema, procedentes dos órgãos norte-americanos de inteligência.
Os únicos documentos disponíveis, acessíveis através do banco de dados Digital National Security Archive (DNSA) e destinados aos estudantes e ao pessoal da mencionada universidade, são "duas breves referências cronológicas" e outro que também é uma cronologia "com mais informação" que as outras duas, admitiram.
Não existem referências a La Coubre no conjunto das coleções não publicadas da instituição, precisaram seus conservadores.
Por tal motivo, confirma-se que o país, cujo aparelho de propaganda gera constantemente rajadas de calúnias contra Cuba, não entregou em meio século um só documento sobre uma tragédia que matou uma centena de seres humanos, há exatamente 50 anos, no dia 4 de março.
Campanha de terrorismo
Para bem entender a tragédia de La Coubre, é preciso situar-se no contexto de 1960, 15 meses depois do triunfo da Revolução Cubana.
A explosão do navio francês no porto de Havana, nos momentos em que se descarregavam munições, fez parte de uma sistemática campanha terrorista contra Cuba, onde ocorrem atentados com uma sequência verdadeiramente infernal.
A cronologia dos incidentes violentos demonstra isso claramente: desde "a morte dum trabalhador por um incêndio em Matanzas, provocado pelo bombardeio de substâncias incendiárias", a inícios de janeiro, até 31 de dezembro com "a sabotagem incendiária de grandes proporções na loja La Epoca, em Havana". Foram às dezenas os atos terroristas denunciados, todos ligados duma forma ou de outra à CIA.
Há apenas dois anos e meio, em julho de 2007, no programa de rádio La noche se mueve, de Miami, o chefe terrorista Antonio Veciana — que reconhece ter trabalhado durante décadas com a CIA — contou com detalhes como "cigarreiras incendiárias" chegavam então a Havana através da CIA. Precisava que vinham em vários modelos, cada uma com um código de cor, que indicava o prazo no qual explodiam.
Incrivelmente, Luis Posada Carriles, contra o qual os procuradores norte-americanos "antiterroristas" do Departamento da Justiça pretendem não ter mais que escassas provas, confirmou isso de punho e letra, nas confissões que redigiu nos anos 80.
O terrorista que torturou em Caracas durante uma década, por ordem da CIA e ordenou a destruição dum avião civil cubano, entre outras infâmias, disse textualmente: "A Agência Central de Inteligência enviava explosivos (C3), lapiseiras de tempo, estopim, detonadores e todo o necessário para atos de sabotagem. Naquele tempo (1960), estas atividades eram conhecidas com o nome de ‘Ação e Sabotagem’".
E Posada, que agora se passeia em Miami com a bénção do FBI, precisava que participou pessoalmente destes crimes:
"Eu fazia parte desses grupos. José Puente Blanco, ex-presidente da Federação Estudantil Universitária, e seu irmão Roberto, comandavam um Movimento. Fui aos Estados Unidos e ali conheci Alfredo Cepero, que pertencia ao mesmo Movimento; os dois planejamos ações para introduzir material bélico em Cuba e entregá-lo aos nossos amigos em Havana".
Por pouco contou o que soube, necessariamente, do crime de La Coubre, com o qual o vincula sua cumplicidade com a agência.
Na verdade, ainda hoje, são dezenas as testemunhas daqueles tempos quando a CIA desatava sua sanguinária ofensiva anticubana: o agente Carlos Alberto Montaner, atualmente prima dona do coro da propaganda norte-americana contra a Ilha, foi então capturado com a mão na massa, enquanto colocava bombas em lojas e cinemas da capital.
Os fatos exigem uma investigação
O maior atentado terrorista da época, a explosão de La Coubre, causou além duma centena de mortos, mais de 200 feridos e inúmeros desaparecidos. O custo dos danos materiais foi logo estimado em aproximadamente US$ 17 milhões.
Dos fatos sobre esta agressão selvagem contra a Revolução, o dr. José Luis Méndez Méndez, reconhecido historiador do terrorismo contra Cuba, fez uma análise detalhada em outubro de 2002, no âmbito duma conferência internacional.
Assinalava então como era evidente que nos Estados Unidos "com certeza se investigou" este crime. "Não é possível ter ignorado as circunstâncias em que estiveram envolvidos vários norte-americanos", afirmava.
Enumerava entre outros muitos elementos suspeitos:
— Um solitário passageiro desse navio, Donald Lee Chapman, dirigia-se a Nebraska, apesar de que desembarcou em Miami, a milhares de milhas de seu destino, enquanto outro, Jack Lee Evans, saiu às pressas de Cuba em 5 de março para declarar em Miami ter conhecido os autores da sabotagem, o que foi uma medida para obstruir as indagações iniciais. "Estavam estes estadunidenses somente no lugar e momento errados?", perguntava o especialista.
— Dois congressistas do estado de Nebraska intercederam a favor de Donald Lee Chapman, enviaram documentos petitórios e exigiram do Departamento de Estado pressionar Cuba para sua libertação.
— O coronel da CIA, J. C. King tivera contatos em Miami com Rolando Masferrer Rojas, criminoso da tirania de Fulgencio Batista, quem liderou grupos paramilitares em Cuba.
— Masferrer tinha-se entrevistado nessa cidade com o norte-americano Richard E. Brooks, que disse conhecer a chegada de navios a Cuba com armas e os portos por onde desembarcariam Que relação existiu entre J.C. King, Masferrer, Brooks e La Coubre?
— A estação da CIA em Havana priorizara a obtenção de informação sobre a chegada de armas. Não foi por acaso que vários estadunidenses, entre eles Chapman, foram detidos quando fotografavam o lugar da explosão no mesmo dia do fato. A embaixada dos Estados Unidos intercedeu por eles.
Lembranças francesas
A tragédia de La Coubre também tem outra característica que obrigava as autoridades norte-americanas a investigarem com seriedade as repercussões do crime: seis marinos franceses morreram na gigantesca explosão.
O primeiro-tenente François Artola, o timoneiro Jean Buron e os marinheiros Lucien Aloi, André Picard, Jean Gendron e Alain Moura morreram no navio destruído.
Coincidência histórica destes tristes acontecimentos: ocorreram no momento em que os escritores Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir visitavam Cuba, a convite de Fidel Castro e de Che Guevara. Estes dois ícones da literatura francesa contemporânea participaram da despedida das vítimas, na Praça da Revolução.
Em 4 de março de 2010, às 15h, enquanto em Havana o povo cubano recordou mais uma vez o aniversário deste crime que custou tantas vidas, dezenas de franceses prestaram homenagem a seus compatriotas assassinados.
Pela primeira vez, há muitos anos, na cidade francesa de Nantes, os marinheiros e trabalhadores do porto, depositaram flores no histórico monumento aos Marinheiros Desaparecidos, com a participação de elementos de vários sindicatos da CGT solidários com Cuba, além de representantes do conjunto das associações de solidariedade e dos diplomatas representando Cuba na França.
Ali como em Cuba, ressoou a pergunta essencial acerca do crime de La Coubre, formulada pelo líder da Revolução cubana em suas Reflexões de 7 de julho de 2007.
"Por quê, em nome da liberdade de informação, não se revela um só documento que nos diga como a CIA, há já quase meio século, fez explodir o navio La Coubre?"
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