sexta-feira, 2 de setembro de 2016

Primeira Declaração de Havana: povo cubano reage contra o imperialismo

Fidel Castro durante a Primeira Declaração de Havana. Foto: Raúl Corrales
Do Fuzil contra Fuzil

Em 1960, num 2 de setembro, em um contexto em que os Estados Unidos se utilizavam da Organização de Estados Americanos como ferramenta para dominação de toda América Latina e para hostilizar Cuba, quando a organização declarava que Cuba era "um perigo para toda a América", mais de um milhão de cubanos se reuniram em Havana e em assembleia geral aprovaram a seguinte declaração denunciadora lida por Fidel Castro:


"Primeira Declaração de Havana"

(2 de Setembro de 1960)

Junto a imagem e a lembrança de José Martí (APLAUSOS), em Cuba, Território Livre da América (APLAUSOS), o povo, em uso das potestades inalienáveis que dimanam do efetivo exercício da soberania, expressada no sufrágio direto, universal e público, se constituiu na Assembleia Geral Nacional (APLAUSOS).

“Em nome próprio, e coletando o sentir dos povos da nossa América, a Assembleia Geral Nacional do Povo de Cuba,

“PRIMEIRO: Condena em todos os seus termos a denominada Declaração de São José da Costa Rica, documento ditado pelo Imperialismo norte-americano, e atentatório à autodeterminação nacional, à soberania e à dignidade dos povos irmãos do Continente (APLAUSOS).

“SEGUNDO: A Assembleia Geral Nacional do Povo de Cuba condena energicamente a intervenção aberta e criminosa que durante mais de um século exerceu o Imperialismo norte-americano sobre todos os povos da América Latina; povos que mais de uma vez viram a invasão de seu solo no México, Nicarágua, Haiti, Santo Domingo ou Cuba; que perderam perante a voracidade dos imperialistas ianques extensas e ricas zonas, como Texas, centros estratégicos vitais, como o Canal do Panamá, países inteiros, como Porto Rico, convertido em território de ocupação; que sofreu, além disso, o trato vexatório dos fuzileiros navais, o mesmo contra nossas mulheres e filhas que contra símbolos mais altos da história da pátria, como a efigie de José Martí.” (APLAUSOS)

Essa intervenção, consolidada na superioridade militar, em tratados desiguais e na submissão miserável de governantes traidores, converteu, ao longo de mais de cem anos, a nossa América, a América que Bolívar, Hidalgo, Juárez, San Martín, O'Higgins, Sucre, Tiradentes e Martí, quiseram livre, no critério de exploração, no quintal do império financeiro e político ianque, na reserva de votos para os organismos internacionais, nos quais os países latino americanos temos figurado como manada do “Norte revolto e brutal que nos despreza” (APLAUSOS).

“A Assembleia Geral Nacional do Povo declara que a aceitação por parte de governos que assumem oficialmente a representação dos países da América Latina dessa intervenção continuada e historicamente irrefutável, trai os ideais independentistas de seus povos, apaga sua soberania e impede a verdadeira solidariedade entre nossos países; o que obriga essa Assembleia a repudiá-la, em nome do povo de Cuba, e com voz que reúne a esperança e a decisão dos povos latino-americanos e o sotaque libertador dos heróis imortais da nossa América (APLAUSOS).

“TERCERO: A Assembleia Geral Nacional do Povo rechaça a tentativa de preservar a Doutrina Monroe, utilizada até agora, como previu José Martí, “para estender o domínio na América dos imperialistas vorazes, para injetar melhor o veneno também denunciado a tempo por José Martí, “o veneno dos empréstimos dos canais, das ferrovias...”

“Por isso, frente ao hipócrita panamericanismo que é só predomínio dos monopólios ianques sobre os interesses de nossos povos e gestão ianque de governos prosternados ante a Washington, A Assembleia do Povo em Cuba proclama o latino-americanismo libertador que pulsa em José Martí e Benito Juárez (APLAUSOS). E, ao estender a amizade até o povo norte-americano – o povo dos negros linchados, dos intelectuais perseguidos, dos trabalhadores forçados a aceitar a direção de gangsteres –, reafirma a vontade de marchar “com todo mundo e não com uma parte dele” (APLAUSOS).


“QUARTO: A Assembleia Geral Nacional do Povo declara que a ajuda espontaneamente oferecida pela URSS a Cuba no caso de nosso país ser atacado por forças militares imperialistas não poderá ser considerado jamais como um ato de intromissão, senão que constitui um evidente ato de solidariedade, e que essa ajuda brindada a Cuba ante um iminente ataque ao pentágono ianque (EXCLAMAÇÕES), honra tanto o Governo da URSS que a oferece, como desonram ao Governo dos Estados Unidos suas covardes e criminais agressões contra Cuba (APLAUSOS).

“PORTANTO: A Assembleia Geral Nacional do Povo declara ante América e o mundo que aceita e agradece o apoio dos foguetes da URSS (APLAUSOS E EXCLAMAÇÕES DE: “Morre, gringo!”), se seu território for invadido por forças militares dos Estados Unidos.

“QUINTO: A Assembleia Geral Nacional do Povo de Cuba nega categoricamente que tenha existido pretensão alguma por parte da URSS ou da República Popular da China de “utilizar a posição econômica, política e social de Cuba, para quebrar a unidade continental e colocar em perigo a unidade do hemisfério”.

“Desde o primeiro até o último disparo, desde o primeiro até o último dos 20 000 mártires que custaram a luta para derrubar a tirania e conquistar o poder revolucionário, desde a primeira até a última lei revolucionária, desde o primeiro até o último ato da Revolução, o povo de Cuba atuou por livre e absoluta determinação própria, sem que, por isso, se possa culpar jamais a URSS ou a República da China pela existência de uma revolução que é a resposta cabal de Cuba aos crimes e às injustiças instauradas pelo imperialismo na América (APLAUSOS E EXCLAMAÇÕES DE: “Fidel, é certo, nos ianques dá duro!” (tradução livre não tem rima)).

“Pelo contrário, a Assembleia Geral Nacional do Povo de Cuba entende que a política de isolamento e hostilidade com a URSS e a República Popular da China, preconizada pelo Governo dos Estados Unidos e imposta por este aos governos da América Latina, e a conduta belicista e agressiva do Governo norte-americano, e sua negativa sistemática a entrada da República Popular da China nas Nações Unidas apesar de representar quase a totalidade de um país de mais de 600 milhões de habitantes, colocam-se em perigo a paz e a segurança do hemisfério e do mundo.

“PORTANTO: A Assembleia Geral Nacional do Povo de Cuba ratifica sua política de amizade com todos os povos do mundo, reafirma seu propósito de estabelecer relações diplomáticas também com todos os países socialistas (APLAUSOS e EXCLAMAÇÕES DE “Khruschev, Kruschev!”), e a partir este instante, em uso de sua soberania e livre vontade, expressa ao Governo da República Popular da China, que concorda com estabelecer relações diplomáticas entre ambos os países e que, portanto, continuam revogadas as relações que até hoje Cuba havia mantido com o regime fantoche que sustentam na Formosa os barcos da Sétima Frota ianque (APLAUSOS).

“SEXTO: A Assembleia Geral Nacional do Povo reafirma – e está segura de fazê-la como expressão de um critério comum aos povos da América Latina – que a democracia não é compatível com a oligarquia financeira, com a existência da discriminação do negro e os excessos da Ku-Klux-Klan, com a perseguição que privou de seus cargos cientistas como Oppenheimer; que impediu durante anos que o mundo escutasse a voz maravilhosa de Paul Robeson, preso em seu próprio país, e que levou à morte, ante o protesto e o espanto do mundo inteiro, e apesar da apelação de governantes de diversos países e do Papa Pio XII, os cônjuges Rosenberg.

“A Assembleia Geral Nacional do Povo de Cuba expressa a convicção cubana de que a democracia não pode consistir só no exercício de um voto eleitoral, que quase sempre é fictício e está gerido por latifundiários e políticos profissionais, senão em direito dos cidadãos para decidir, como agora o faz esta Assembleia Geral do Povo de Cuba, seus próprios destinos. A democracia, além disso, só existirá na América quando os povos sejam realmente livres para escolher, quando os humildes não estejam reduzidos – pela fome, pela desigualdade social, pelo analfabetismo e os sistemas jurídicos – à mais ameaçadora impotência.

“Por isso, a Assembleia Geral Nacional do Povo de Cuba: condena o latifúndio, fonte de miséria para o camponês e sistema de produção agrícola retrógrado e desumano; condena os salários de fome e a exploração desigual do trabalho humano por bastardos e privilegiados interesses; condena o analfabetismo, a ausência de professores, de escolas, de médicos e de hospitais; a falta de proteção na velhice que impera nos países da América; condena a discriminação do negro e do índio; condena a desigualdade e a exploração da mulher; condena as oligarquias militares e políticas que mantêm nossos povos na miséria, impedem seu desenvolvimento democrático e o pleno exercício de sua soberania; condena as concessões dos recursos naturais de nosso país aos monopólios estrangeiros como política entreguista e traidora dos interesse dos povos; condena aos governos que ignoram o sentimento de seus povos para acatar os mandatos de Washington; condena o engano sistemático aos povos por órgãos de divulgação que respondem ao interesse das oligarquias e a política do imperialismo opressor; condena o monopólio de notícias por agências ianques, instrumento de trusts norte-americanos e agentes de Washington; condena as leis repressivas que impedem os trabalhadores, camponeses, estudantes e os intelectuais, as grandes maiorias de cada país, de organizarem-se e lutarem por suas reivindicações sociais e patrióticas; condena os monopólios e empresas imperialistas que saqueiam continuamente nossas riquezas, exploram os nossos trabalhadores e camponeses, sangram e mantêm em atraso nossas economias, e submetem a política da América Latina a seus desígnios e interesses.

A Assembleia Geral Nacional do Povo de Cuba condena, por fim, a exploração do homem pelo homem (APLAUSOS), e a exploração dos países subdesenvolvidos pelo capital financeiro imperialista. Em consequência, a Assembleia Geral Nacional do Povo de Cuba proclama perante a América:

“O direito dos camponeses à terra; o direito do trabalhador ao fruto do seu trabalho; o direito das crianças à educação; o direito dos doentes à assistência médica e hospitalar; o direito dos jovens ao trabalho; o direito dos estudantes à educação gratuita, experimental e científica; o direito dos negros e dos índios à “dignidade plena do homem”; o direito da mulher à igualdade civil, social e política; o direito dos idosos a uma velhice segura; o direito dos intelectuais, artistas e cientistas a lutar, com suas obras, por um mundo melhor; o direito dos Estados a nacionalização dos monopólios imperialistas, resgatando assim as riquezas e recursos nacionais; o direito dos países ao comércio livre com todos os povos do mundo; o direito das nações pela sua plena soberania; o direito dos povos em converter suas fortalezas militares em escolas, e armar seus trabalhadores, seus camponeses, seus estudantes, a seus intelectuais, o negro, o índio, a mulher, o jovem, o idoso, todos os oprimidos e explorados, para que defendam, por si mesmos, seus direitos e seus destinos (APLAUSOS E EXCLAMAÇÕES DE: “Fidel, Fidel; Fidel, Fidel, Fidel, que tem Fidel, que os americanos não podem com ele!”).

“SÉTIMO: A Assembleia Geral Nacional do Povo de Cuba postula: O dever dos trabalhadores, dos camponeses, dos estudantes, dos intelectuais, dos negros, dos índios, dos jovens, das mulheres, dos idosos, de lutar por suas reivindicações econômicas, políticas e sociais (APLAUSOS); o dever das nações oprimidas e exploradas de lutar por sua libertação; o dever de cada povo de solidariedade com todos os povos oprimidos, colonizados, explorados ou agredidos (APLAUSOS), seja qual for o lugar do mundo em que estes se encontrem e a distância geográfica que os separe. Todos os povos do mundo são irmãos! (EXCLAMAÇÕES DE: “Unidade, Unidade!”.)

“OITAVO: A Assembleia Geral Nacional do Povo de Cuba reafirma sua fé de que a América Latina marchará em breve, unida e vencedora, livre das ataduras que convertem suas economias em riquezas alienadas ao imperialismo norte-americano e que a impede de fazer ouvir sua verdadeira voz nas reuniões onde os chanceleres domesticados fazem coro vergonhoso ao amo despótico. Ratifica, por isso, sua decisão de trabalhar por esse destino latino-americano comum que permitirá aos nossos países edificar uma solidariedade verdadeira, assentada na livre vontade de cada um deles e nas aspirações conjuntas de todos. Na luta por essa América Latina liberada, frente às vozes obedientes de quem usurpa sua representação oficial, surge agora, com potência invencível, a voz genuína dos povos, voz que abre caminho desde as entranhas de suas minas de carvão e de estanho, desde suas fábricas e centros açucareiros, desde suas terras enfeudadas, onde maltrapilhos, caboclos, gaúchos, campesinos, herdeiros de Zapata e de Sandino, empunham as armas de sua liberdade, voz que ressoa em seus poetas e em seus romancistas, em seus estudantes, em suas mulheres e em suas crianças, em seus idosos enfermos. A essa voz irmã, a Assembleia Geral Nacional do Povo de Cuba lhe responde (APLAUSOS): Presente! Cuba não falhará. Aqui está hoje Cuba para ratificar, ante América Latina e ante todo o mundo, como um compromisso histórico, seu dilema irrenunciável: Pátria ou Morte.

“NONO: A Assembleia Geral Nacional do Povo de Cuba.

“Resolve que esta declaração seja conhecida com o nome de 'Declaração de Havana', Cuba, Havana, Território Livre da América. 2 de setembro de 1960.” (APLAUSOS.)

Submetemos esta Declaração de Havana à consideração do povo, quer dizer, que os que apoiam a Declaração levantem a mão (A MULTIDÃO LEVANTA A MÃO). (DURANTE VÁRIOS MINUTOS EXCLAMAM: “Já votamos com Fidel!” e “Fidel, Fidel, que tem Fidel, que os americanos não podem com ele!” e “Viva Raúl Roa!”).

E agora falta algo. E com a Declaração de San José, que fazemos? ( EXCLAMAÇÕES DE: “rasguemo-la!”) Rasguemo-la! (Fidel rasga-a perante a multidão.)

Estes acordos da Assembleia Geral Nacional do Povo de Cuba, que acabamos de efetuar, serão comunicados a todos os povos irmãos da América Latina.

(OVAÇÃO).

Traduzido por Fuzil Contra Fuzil.

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