domingo, 15 de janeiro de 2012

Ramón Labañino: “Continuo sendo o mesmo sonhador”

Por Jorge Enrique Jérez Belisario em Cubadebate
Fonte: VERMELHO
“Frente a adversários tão descomunais sempre se deve estar preparado para o pior, pois assim estaremos prontos para todas as variáveis e mais ainda, para a mais complicada das variáveis.” Assim se expressou Ramón Labañino Salazar que cumpre há 13 anos uma injusta condenação em cárceres norte-americanos pelo único delito de proteger seu povo da morte.


Ramón enfrenta dia após dia a dor de ter que estar afastado de seus entes queridos, de seu povo e da terra que o viu nascer. Este gigante de aproximadamente 1.90 metro de estatura é perseverante, confia na justiça e continua jovem de ideias, de espírito e é capaz de dar amor até nas condições mais extremas que a vida lhe impôs.



Desde a prisão de Jesup, na Georgia, Estados Unidos, apesar das dificuldades que com sua correspondência, por meio do limitado sistema de correios eletrônicos para prisioneiros federais (Corrlinks), que eles pagam com seu trabalho, este cubano simples aproximou sua vida de nós. 

CubadebateComo recordas tua infancia e juventude?
Ramón Labañino: Recordo minha infancia e juventude com muito amor, alegria, ternura. Fui e sempre serei uma criança feliz, cuja maior riqueza é e sempre será o amor que recebia de minha família, minha mãe, dos bons ensinamentos de excelentes professores e dos bons amigos. Penso que foi o período de minha vida que me fez poeta, sonhador, guerreiro e muito mais terno. Essa humildade, transparência, essa nobreza pura e sem maldades, que uma pessoa aprende em tão tenra idade, é a herança mais útil que quero sempre reter e dar a minhas filhas.
Cubadebate: Por que decidiste estudar economia?
RL: Eu tinha muitos sonhos a realizar quando estava terminando a nona série. Minha mãe queria que eu estudasse medicina, ou que fosse militar. Ela se encantava com os uniformes. Mas minha primeira vocação era para os números, e com meus companheiros desses tempos me decidi por economia, profissão de que gosto muito. Claro, nunca pude dizer a minha mãe, que desde jovem eu estava também realizando os seus sonhos: eu era “militar do silêncio”, sem o uniforme cotidiano, desses que, por realizar missões importantes, devem manter bem resguardada a sua identidade para cumprir com as tarefas da pátria. É uma dívida que fiquei com ela, por isso escrevi um poema intitulado “Minha dívida”.

CubadebateFale de um fato que tenha marcado sua vida.
RL: O atentado ao avião de Barbados, nosso povo chorando de indignação na Praça da Revolução e o seriado “Tinha que ser em silêncio”, marcaram não só minha vida, mas a de muitos cubanos dessa época, e ainda nos momentos atuais. Vivo orgulhoso de ter tido o privilégio de servir em nome de evitar tais atrocidades, e dar um pouco de segurança e tranquilidade a nossos povos e tantos seres humanos no planeta.

CubadebateDe que livro gostou mais?
RL: Martí, sempre Martí, todas e cada uma de suas obras. Desde o Ismaelillo, Versos Sencillos, o discurso “Pinos Nuevos”, toda a obra de Martí. Sempre tenho comigo, onde quer que eu vá, um Dicionario Martiano excelente, é meu livro de consulta para tudo, para escrever, para fazer poesia, para resolver conflitos, para aprender a amar e lutar. Outros muitos me comoveram, como Cem anos de solidão de nosso Gabriel Garcia Marques, El reino de este mundo do admirado mestre Alejo Carpentier.

Cubadebate: De que esporte mais gosta?
RL:Desde pequeno pratiquei esportes. O primeiro de todos foi o boxe, que por muito breve tempo aprendi em um ginásio em Lisa, onde residia então. Depois, judô e karatê na Universidade de Havana, e em outros salões mais inóspitos e imprevisíveis. Tenho predileção pelas artes marciais, todo o bom ensino que mostra sua disciplina, inclusive sua espiritualidade. Também jogo muito xadrez, o esporte ciência, que me fascina. Bem, é adequado ter um equilíbrio entre o físico e o mental, assim desfruto bem de ambos os mundos.

CubadebateGeralmente como é um dia de Ramón na prisão?
RL: Meu dia nestes lares universais transcorre entre cartas, leituras (de livros, informações, revistas), respostas às cartas, tanto por correio postal como por e-mail, e durante as tardes sempre pratico algum esporte. Nas noites, ouço rádio, vejo noticiários e me reorganizo para o dia seguinte. Um grande percentual de todo o meu tempo é gasto com as lutas legais sobre o processo, como por exemplo agora estamos defendendo a moção de habeas corpus que nós, os cinco, apresentamos. Uma ou duas vezes por ano recebo visitas de algum familiar, de bons amigos. Trato sempre de romper a monotonía irreflexiva que circunstâncias tão particulares impõem por isso, a cada momento, mudo bruscamente de atividades, de horários, hábitos. É como refrescar-me interna e externamente, é um mecanismo de luta diária contra os anos e os desgastes normais que os tempos impõem.

CubadebateQue diferenças há do Ramón atual para o de 13 anos atrás?
RL: Creio que não mudei muito, continuo sendo o mesmo sonhador, romântico, guerreiro, que aprendi desde criança, inclusive talvez seja agora muito mais poeta da vida do que antes, pois gosto de encontrar detalhes que embelezam, mais do que os que enfeiam. Talvez agora eu tenha a vista mais aguçada diante dos embates adversos, em especial nesta contenda legal que realizamos contra a injustiça e a maldade, e no conhecimento dos homens que, com desapego a todo princípio, decaem de sua escassa estatura. Meu físico tem em si o peso de alguns anos mais, mas com o mesmo espírito e ainda maior que esta nossa causa nos dá a todos.

CubadebateSabemos que apesar da distância, você participou ativamente na educação de suas filhas. Como fez isso?
RL: Minhas filhas são minha vida, minha essência, minha virtude e também minha responsabilidade. Trato de usar cada canal e via de comunicação para estar no dia a dia com elas. As cartas, os correios eletrônicos e os telefonemas são cotidianos. Graças às excelentes mães que têm e que tanto me ajudam a ser o melhor pai possível nesta distância dura. Talvez eu peque por excesso, por querer conhecer tudo em todo momento, no que se refere a elas; é minha forma e meu zelo por elas, de dizer-lhes que sempre estou ali com elas, nas coisas boas e muito mais nas coisas más que lhes possa ocorrer. Não há maior alegria para mim do que quando em suas vozes de anjo escuto “te amo papai” ou “sinto muito tua falta”. Depois disso, é o nada…

CubadebateTua vida está rodeada de amores. O que Elizabeth significou em tua vida?
RL: Minha Ely é tudo para mim, meu apoio, minha força, minha energia, minha inspiração, meu amor e minha amante, minha Penélope sonhada, minha amiga e fiel companheira, meu idílio e minha promessa, minha fantasia real, minha doce quimera. É minha presença mesmo quando está ausente. E é assim por muitas razões, aprendi a amá-la admirando-a e a admirá-la amando-a.

CubadebateComo o pensamento de Fidel influiu em tua personalidade?
RL: Influiu em tudo, pois Fidel é a virtude e a mais pura herança de todos os cubanos dignos de nossa história, que é capaz de resumir em si mesmo, desde o pensamento martiano, de Maceo, de todos os nossos mambises (guerrilheiros que no século 19 lutaram pela independencia de Cuba – nota da tradução), até o momento atual e creio que até o futuro eterno, a valentia, a inteligência e visão histórica do melhor de nossa Cubania e nosso socialismo.

CubadebateFidel é exemplo e líder, e sem dúvida alguma é o companheiro fiel que nos acompanha sempre nesta luta pela verdade de Cuba e a nossa liberdade. Que momentos de tua vida recordas com maior felicidade?
RL: Os momentos mais felizes que vivo nestes tempos de prisão política, são os dias em que desfruto da visita de minhas “mulheres da alma” (como eu chamo minha esposa Ely, minhas filhas Ailí, Laura e Lizbeth. São instantes em que nos olvidamos de tudo e tratamos de atuar como se estivéssemos em casa, rindo, analisando, fazendo planos, amando… felicidade que também é possível graças ao sacrifício de todo o nosso povo e todos os solidários do mundo, como sempre explico a nossas filhas. Também desfrutamos muito as visitas de companheiros e amigos que nos enchem de afeto e carinho. A felicidade realmente é um estado de ânimo intimista, está dentro da própria pessoa, dos próprios valores como ser humano, da alma pura e limpa de mesquinharias materiais e humanas. Por isso, embora pareça idílico, o fato de estarmos trancados por defender uma causa justa que conta com o apoio de milhares de pessoas em todo o mundo, nos faz sentir, de alguma manera, sublimes, em um estado de complacência próximo à felicidade, já que esta só será real e eterna quando sejamos todos, os cinco, total e completamente livres e sob nossas palmeiras, com a bandeira tremulando no alto, com a alegria de nosso povo amado.

Cubadebate: Como vês o futuro?
RL:O futuro é belo. Penso em uma pátria nossa cada vez mais livre, mais socialista, mais humana. Conquistaremos os melhores níveis possíveis em desenvolvimento social, na economia, em nosso sistema tipicamente cubano. A humanidade estará algum dia sem guerras nem destruição.

O futuro da humanidade será muito mais pacífico e humano. Sonho com um mundo em que não exista o capitalismo, onde o homem seja amigo do homem, sem fronteiras, sem dinheiro, sem avarezas imperiais, sem egoísmos. Jamais haverá guerras, nem crianças famintas ou morrendo por falta de atenção médica. Parece uma utopia mas não é, se pensamos e cremos fielmente no socialismo e no comunismo (como fase superior da humanidade), então a gente se dá conta de que esse mundo é possível, real e imprescindível. É por ele que lutamos dia a dia com todo o nosso denodo.

CubadebateSe o mundo te pedisse uma mensagem, o que dirias?
RL: Para todos os irmãos e irmãs do mundo, vai a nossa mensagem de amor e gratidão, por tudo o que dão no dia a dia a nossa causa, por Cuba. Vivemos momentos definitivos em nosso processo, mas sabemos que com o apoio e a solidariedade de todos, conquistaremos a vitória. Sonhamos com o dia em que poderemos abraçá-los todos já em plena liberdade.

CubadebateQue significa para ti ser cubano?
RL: Nós nos sentimos profundamente orgulhosos de nosso povo. Nossas raízes mambises, rebeldes, revolucionárias, são uma das maiores joias sociais que um povo pode ter. Isso unido ao caráter carinhoso, afável e amigo, que nos caracteriza.

Graças ao processo revolucionário que vivemos, graças a nosso socialismo, podemos contar com uma sociedade culta, com níveis de saúde e de educação que são exemplo para muitos países do mundo, inclusive os mais desenvolvidos.

Nosso povo é capaz de dar o melhor de si a outros, inclusive aquilo que nos falta, até a própria vida, para ver livres e soberanas outras nações. Essa solidariedade humana que faz grandes proezas pelo bem da humanidade.

Com um povo como o nosso, toda vitória é possível, por isso estamos tão convencidos de que nós também venceremos.

Tradução da redação do Vermelho

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