Fonte: Inocêncio Nóbrega / DiariodeIguape.com
Só o samba tem a linguagem própria da crítica irônica, nascido em resposta à política repressiva das autoridades policiais cariocas de 1913, que prometiam prisão para quem o praticasse, por considerá-lo obra de negro desocupado. Devido a isso o ritmo logo cresceu, servindo, de escudo à classe média. “Pelo Telefone”, de Donga e Mauro de Almeida, dado o sucesso popular de sua letra, evoluiu, mais tarde, para novas formas de abordagem a desditosas situações sociais do país, respeitando-se os períodos de negritude democrática. O samba-enredo é o natural desdobramento de sua origem, para melhor trazer às massas um misto de sátira e conhecimento, quando personalidades, natureza e patrimônio nacional passam a ser lembrados. O conceito de pátria latino-americana, como instituto de defesa ante a opressão imperialista, já está sendo explorado no Brasil, cabendo a Florianópolis o privilégio de fazê-lo, com tamanha ousadia.
A Passarela Nego Quirido, da capital catarinense, viu-se tomada de uma multidão de foliões para assistir ao desfile da escola de samba local, ainda incipiente, “União da Ilha da Magia”, com seus 2,5 mil integrantes, no sábado de carnaval deste ano, à noite. O enredo, “Cuba, sim, em nome da verdade”, homenageava a nação caribenha, no asfalto juntava-se à bateria fardada de guerrilheiros, carros alegóricos, um trazendo a escultura de José Marti, ao lado de porta-bandeiras, salientando a amizade Cuba – União Soviética. O outro, simulando tanque de guerra, estando a bordo um sósia de Che Guevara, e sua filha, em pessoa, Aleida Guevara. Vinham precedidos de 22 alas, representando o Tio Sam e o “Paraíso de ricos e milionários”. Chamadas à “Nacionalização de empresas estrangeiras” e “Educação e Saúde para todos”, não foram esquecidas.
O sindicalista Valmir Braz de Souza foi o mentor intelectual, talvez da maior festa carnavalesca de 2011 do Brasil, no sentido de conteúdo. Responsável pelo enredo, antes esteve em Havana, observando sua musicalidade. De volta, sobraram colaborações espontâneas, incentivos da edilidade e da Lei Rouanet. Esse carnaval foi considerado belíssimo, para contrariar o comentarista Reinaldo Azevedo, da “Veja”, que não aceitava a concepção da idéia, que certamente servirá de esteio para futuras interpretações momescas. Aleida disse que a história da Revolução cubana havia sido contada em livros e filmes, nunca através de samba.
Inocêncio Nóbrega é jornalista
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