terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

CUBA: uma viagem ao futuro

por Ana Luíza F. Cartana e Gabriel Martins

Entre os dias 24 de janeiro e 06 de fevereiro realizou-se a XVIII Brigada Sulamericana de Solidariedade a Cuba. No evento, delegações de Argentina, Brasil, Chile e Uruguai, além de participantes da Costa Rica, reuniram-se a fim de melhor conhecer a realidade cubana e contribuir com os movimentos de solidariedade a este país espalhados pelo mundo.

Apesar de muito distintas das brigadas de trabalho do princípio do triunfo da Revolução Cubana, cujo intuito era o de reconstruir um país, as últimas brigadas vêm sendo de imensa relevância para o povo cubano, que, com elas, constrói laços de amizade com outros povos. Nesta Brigada, especificamente, os mais de trezentos delegados, dos quais 105 brasileiros, tiveram diversos tipos de atividades. Participamos de diversas atividades culturais, assistindo a peças de teatro, apresentações de canto, dança e recitação de poesias; uma passeata em solidariedade ao povo venezuelano e seu processo de radical transformação social iniciado há doze anos; festas; passeios a praias, centros históricos, museus, monumentos; visitas a hospitais e escolas; e participamos também de quatro conferências sobre temas controversos e atuais sobre Cuba.

Em todas as atividades tivemos ativa participação, com espaço para perguntas e respostas e profunda contextualização de cada tema.


Cuba: uma viagem ao passado

As impressões de todos os brigadistas que conversamos, brasileiros ou não, são, em sua imensa maioria, muito positivas. Particularmente, as nossas foram ainda mais positivas. Nossa viagem iniciou alguns dias antes da Brigada e ficamos em Havana, em uma área bastante voltada ao turismo. As impressões quanto a estrutura do país foram muito boas. Apesar do que para muitos é chocante, como a antiguidade dos carros particulares e a fachada de muitas casas, chamaram nossa atenção as amplas e boas avenidas, ruas e rodovias, excelentes meios de transporte coletivo, etc.

Os primeiros contatos com os habitantes da cidade foram um grande balde de água fria nas expectativas revolucionárias e pró-socialistas nossas. Os primeiros cubanos com quem conversamos demonstraram grande descontentamento com a realidade cubana. Seus argumentos, genericamente, resumem-se às dificuldades em viajar e às inevitáveis comparações entre as dificuldades do povo cubano e as “amplas liberdades” dos outros povos. As comparações são baseadas, claramente, nos contatos com os turistas desses países, desconsiderando o fato de que os turistas são, em sua imensa maioria, pessoas que fazem parte da camada mais rica de cada país.

Em nosso primeiro encontro com outros brigadistas brasileiros, escutamos a primeira definição mais sintética sobre Cuba: uma visita ao passado. A definição, vinda de uma grande militante, referia-se a paisagem pacata, com trânsito tranqüilo, repleto de carros antigos e casarios com cores pouco usadas nos países centrais do capitalismo ou mesmo no Brasil.


Brigada Sulamericana
Após três dias em Havana, antes do princípio da Brigada Sulamericana, nos juntamos aos demais brigadistas e iniciamos as atividades políticas, as visitas guiadas e os contatos com os lugares históricos junto de um grupo grande de pessoas.

Na maior parte do tempo ficamos alojados no CIJAM (Campamento Internacional Julio Antonio Mella), um acampamento na cidade de Caimito, há poucos quilômetros de Havana, mas ficamos também em dois hotéis, nas cidades de San Antonio de los Baños, também muito próximo a Havana, e Morón, na cidade de mesmo nome situada na província de Ciego de Ávila. As viagens nos permitiram estreitar contatos com os demais brigadistas, além de conhecermos o país de forma mais aprofundada, e não só a província da Capital.

Visitamos as cidades de Havana, Caimito, Santa Clara, Morón, Ciego de Ávila e Matanza. Tivemos a oportunidade, com essas viagens, de conversar com os moradores, passear pelas cidades e visitar lugares históricos como o Museu da Revolução, a Praça da Revolução, o Monumento ao Galo de Morón, o Monumento em Homenagem a Vaquerito, o Complexo Escultórico Che Guevara e o Trem Blindado de Santa Clara (local onde a coluna nº dois, de Che Guevara, com apenas 18 homens derrotou um trem blindado com mais de quatrocentos militares, entre soldados e oficiais, fortemente armados), além de vermos as belezas naturais de Cayo Coco e Varadero e discutirmos acerca do papel do turismo em Cuba.

Participamos também de atividades com dois CDRs (Comitês de Defesa da Revolução), além de termos um espaço para conversarmos com representantes da CTC (Central de Trabalhadores de Cuba), FMC (Federação de Mulheres Cubanas), UJC (União da Juventude Comunista – juventude do Partido Comunista Cubano) e com os próprios CDRs.

Reiteramos que em todas as atividades a participação era incentivada. Em todas as conferências, palestras e convenções tínhamos oportunidade para perguntas e respostas e as (muitas) dúvidas que ainda temos são hoje fruto de diversas reflexões que tivemos a partir do espaço que tivemos para esclarecermos as antes pouco complexas questões que possuíamos.


Cuba: uma viagem ao futuro

Ao final de dezoito dias em Cuba, de conhecermos seis cidades, centenas de brigadistas de quatro países, membros do Partido Comunista Cubano, membros de alguns CDRs, da FMC, familiares dos Cinco Heróis Cubanos presos nos Estados Unidos, combatentes da Playa Girón (Baía dos Porcos), e um sem-número de cubanos com todas as opiniões possíveis, nossas impressões são mais positivas que as que tínhamos antes de conhecer este peculiar arquipélago caribenho.

Conhecemos uma sociedade que na luta contra uma ditadura acumulou forças para não somente derrubar um ditador (Fulgêncio Batista), mas para construir um país autodeterminado por seu povo, com ampla participação e discussão política.

A estrutura política cubana nos impressionou. As discussões políticas iniciam nos CDRs, que se assemelham, muito vagamente, com associações de moradores. Em todas as cidades cubanas, das mais rurais à capital, existe um CDR por quadra. Todos os moradores desta quadra podem participar, bem como fazerem parte da direção, podendo votar e serem votados. Os diretores de cada CDR votam para os representantes municipais e assim sucessivamente até os representantes nacionais.

O mais interessante de toda essa estrutura não é, entretanto, o sistema de votação, mas a participação política. Mais que legítima representatividade, o povo cubano possui protagonismo nas decisões, que não são tomadas por seus “representantes”, nem apenas votadas por eles, mas os projetos em si são iniciados nos CDRs pela própria população. Deste modo, a famigerada “ditadura castrista” mostrou-se como mais uma lenda impetrada contra uma população que optou, legitimamente, por construir seu próprio caminho soberanamente.

Quanto a arquitetura do país, não podemos afirmar que há alguma vanguarda neste sentido. A maioria das construções é anterior a revolução e muitas delas são da época colonial. Muitas casas possuem fachadas não conservadas, apesar de muitas das casas da aristocracia cubana terem recebido uma utilidade de prédio público, que variam entre museus e moradias estudantis. Também podemos observar que todo o país tem uma política de disponibilizar moradia a todos. Em todo o arquipélago não existem moradores de rua.

Ao final da viagem, percebemos que Cuba não é um paraíso, mas um país que, apesar de um criminoso bloqueio econômico - fruto de uma política imperialista contrária à autodeterminação dos povos que sustentam com seu sangue, suor e lágrimas os países dominantes do “mundo globalizado” - é construído por todo um povo que luta por sua soberania e que, apesar dos traços do passado, frutos também do bloqueio econômico, apresenta traços do único futuro possível para a manutenção da vida humana na Terra: a soberania de cada povo em determinar seu futuro, livre da exploração do homem sobre o homem.

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