quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Brasil e Cuba produzem animação sobre solidão na infância

O Caminho das Gaivotas | Foto: CTAV
Do Vermelho 

Era uma vez um país chamado Brasil, que decidiu fazer um filme para crianças. Para isso, pediu ajuda a outro país, chamado Cuba. E juntos criaram um desenho animado para crianças abandonadas. Não aquelas que vivem nas ruas, ou as órfãs, mas sim as que sofrem o abandono de querer falar e não serem ouvidas.

É para as que não escutam mais canções de ninar ou cantigas de roda, mas sabem de cor jingles publicitários. A elas é dedicado o curta O Caminho das Gaivotas, a primeira produção da série Histórias do Coração, fruto do acordo de cooperação cinematográfica firmado em 2009 pelos dois países que, como diz a produtora e coordenadora do projeto Patrícia Alves Dias, "têm tanto em comum."

E este "comum" vai além da latinidade estereotipada. Mais que a música, o arroz com feijão, a negritude, a alegria brasileiras e cubanas, a série quer dar voz a crianças que, cubanas ou brasileiras, querem se comunicar. Para dar voz ao filme, a equipe binacional escalou ninguém menos que Omara Portuondo.

A diva de Buena Vista Social Club dá vida à personagem da avó que conta, e canta, para as crianças. Já para "musicar" o filme, foi escalado o jovem maestro cubano Harold López-Nussa, que devia traduzir, em sons, a solidão de uma menina que não conseguia ser ouvida. Nussa, que cresceu em uma Cuba preocupada em acolher suas crianças, teve dificuldade no início. "Não conseguia imaginar como uma criança tenta chamar a atenção de um adulto e não é ouvida", disse, em uma tarde de mixagem do filme em São Paulo.

Depois de muito pensar, ele encontrou este "abandono" ao observar que hoje as crianças cubanas cantam reggaeton. "São letras tão absurdas que tenho vergonha de repetir. Percebi que, já que o reggaeton está em toda América Latina, as crianças estão sim abandonadas. É um abandono sutil, físico e emocional."

Para Patrícia, que percorreu Cuba e Brasil, ouvindo a opinião de muitos velhos e crianças, a infância precisa ser "ninada". "E é por isso que o filme se tornou uma história e uma canção de ninar. A criança precisa ser acolhida. Quando se põe uma criança por cinco horas na frente da TV, ela está abandonada", contou a coordenadora da "frente Brasil" do projeto financiado pela Secretaria do Audiovisual, que tem direção de Sergio Glenes e Daniel Herthel.

Em Cuba, a equipe conta também com Esther Hirzel, Alex Cabanas, Aramis Acosta Caulineau, Alexandre Rodriguez e Bárbaro Ortiz, do lendário Icaic. No currículo, são sete longas produzidos, dezenas de coproduções com a Europa. "E têm mais cinco filmes em pré-produção, todos com foco na infância. Estava mais do que na hora de nós, latino-americanos, produzirmos juntos. Mais do que uma política de Estado em cinema que aposta na nossa indústria da animação, é também política pela infância acreditar que nossas crianças têm o direito de serem ouvidas."

E como essas Histórias do Coração vão chegar aos ouvidos de nossas crianças? "Primeiro vamos fazer uma estreia em Cuba, para comemorar os 52 anos do Icaic. Depois, no Brasil, estreia no Festival Internacional de Cinema Infantil de Florianópolis, em junho. Em seguida, vamos exibir em vários festivais, nas TVs públicas, distribuir pela Programadora Brasil e, finalmente, fazer DVDs e distribuir na base do "quer? toma!". O importante é que a história seja contada."

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