Mas, como ocorre com tudo: uma coisa é a realidade, outra seu reflexo. Cuba é Cuba, Miami seu reverso. O engraçado é que as grandes corporações da mídia não descrevem o que acontece em Cuba, se comportam como um espelho. Eles escondem os fatos e relatam os desejos.
Por Ubieta Enrique Gomez
Fotos Alex Castro e Ismael Francisco
Fonte: LA ISLA DESCONOCIDA
Tradução: Robson Luiz Ceron - Blog Solidários.
Miami é um espelho. Toque-o, verá a superfície lisa, e acabará a ilusão de que as coisas ali têm volume. Miami é um espelho que reflete o rosto de Cuba. Às vezes, alguém fica confuso e diz: "existem duas Cubas", a de aqui e a de lá. Porém, os espelhos invertem as imagens. Em Miami, um viajante desinformado escutará espantado astutos vendedores anunciando: "a verdadeira cerveja de Cuba", "o verdadeiro café de Cuba". Muitos espaços públicos receberam o nome igual aos da Ilha. As palavras também mudam: Fidel é Castro; Playa Girón é Baía dos Porcos; bloqueio é embargo; e o herói de Girón é um mercenário da Baía dos Porcos, para o qual se erigiu um pequeno monumento. Alguns grupos e indivíduos contra-revolucionários se definem como revolucionários. Os Cinco presos políticos cubanos - que salvaram vidas daqui e de lá - são desdenhosamente chamados espiões, e Posada Carriles - autor dos atentados a um avião civil (que resultou na morte de todos os passageiros) e a hotéis e lugares público na ilha - é tratado como um herói. Che Guevara, que renunciou ao poder para dar a sua vida pelos outros, lá é chamado de assassino, e Fulgencio Batista é considerado uma figura importante na história, uma vítima da propaganda comunista.
Mas, como ocorre com tudo: uma coisa é a realidade, outra seu reflexo. Cuba é Cuba, Miami seu reverso. O engraçado é que as grandes corporações da mídia não descrevem o que acontece em Cuba, se comportam como um espelho. Eles escondem os fatos e relatam os desejos.
Mancomunam-se. Cumprem uma função sagrada: construir (e manter), de uma maneira crível, um estado da opinião sobre a Revolução Cubana que se parece com Miami. Por quê? Porque Miami é a Disneylândia da contra-revolução Latino Americana: feita para seduzir e ocultar, nela vive os anti-sandinistas, os anti-bolivarianos e todos os capos do Sul, que pressentem sua queda (ou já caíram) e querem se reciclar. A síndrome de Miami nos meios de comunicação - fechar os olhos à realidade e substituí-la por outra mais conveniente - é devastadora: El Pais e alguns meios de comunicação espanhóis são mais semelhantes ao El Nuevo Herald, do que seus similares europeus.
É natural que se os vencidos haviam anunciado que a solução final - a única a que poderiam aspirar - era a morte natural ou violenta de Fidel, o que aconteceu nos últimos quatro anos, mantenha-os desconcertados: chegou "o dia seguinte", com a doença do líder revolucionário, a Revolução - que é de todos - não entrou em colapso, e agora Fidel reaparece, tão vital e lúcido como sempre, e o tsunami de sua presença arrasa com a cidade das fantasias. Ontem aconteceu algo que dissolveu, em horas, muitos anos de paciente construção midiática: as transnacionais insistem obsessivamente em dizer que os jovens cubanos (que se formaram em tempos difíceis sem alguns benefícios e as certezas de outras décadas) não pensam mais em Revolução, e que os vínculos emocionais e racionais com as lideranças históricas deste processo já haviam sido quebrados.
Eles inventaram todos os tipos de figuras - blogueiros, pseudo-roqueiros, palhaços - que são apresentados como "a nova juventude" de Cuba. Mas, ontem, Fidel fez um chamado aos jovens universitários cubanos. Luisa, uma amiga que é estudante da universidade e líder da Juventude Comunista, me confessou: "Nós sentimos que o desafio seria enorme, porque nós tínhamos que chamar em 24 horas, uma estudantada que estava de férias, muitos que estavam na praia ou em outras províncias. Mas, a resposta foi fantástica. Conheço quem voltou imediatamente para não perder o encontro". Acorreram mais de dez mil jovens. Minha sobrinha, que chegou às escadarias da Universidade de Havana às quatro da manhã, me disse que quando Fidel apareceu se fez um emocionante silêncio e houve quem não pode evitar as lágrimas de alegria.
Um fato é um fato, mas uma nota de imprensa - que interpreta o fato e o leva de volta para o sagrado objetivo de fortalecer a matriz do pensamento construído - é uma nota de imprensa.
Javier Otazú trabalha para a EFE (Reuters). Ele não podia se dar ao luxo de contrariar a "verdade" forjada e cozinhou uma nota com todos os ingredientes: algumas pitadas de verdade, partes do discurso, e frases contraditórias ou abertamente falsas. Os diferentes meios de comunicação espanhóis - RTVE, El Pais e El Mundo, por exemplo (que representam a "diversidade" de enfoques de uma "democracia" de mercado) - não só foram repetitivos no conteúdo divulgado, mas fizeram-no com as mesmas palavras, literalmente, e embora eu não tenha avançado na minha pesquisa, tenho certeza que encontraria algumas passagens idênticas nos meios de comunicação da direita na América Latina, dependentes de Miami e das grandes transnacionais de mídia latino-americana.
Os jovens entrevistados, no entanto, foram enfáticos em seu apoio a Fidel e a Revolução: "Nós ficamos arrepiados e o coração acelera quando vemos Fidel diante de nós e ver como ele nos pode falar e continuar lutando... Nós sempre vamos o ver bem", declarou Carlos, 16 anos, que apesar de não ter sido convocado, por não ser acadêmico, não perdeu a oportunidade.
"Está muito saudável e muito forte, eu creio que há Comandante por muito tempo", disse Dunieski, que trabalha na Universidade de Ciência da Computação, e sua amiga, Yenny, continuou: "Isto é o que precisamos neste momento. Esta conversa nos alerta e anima".
Mas essas sinceras declarações foram precedidas pelo parágrafo produzido, quem mais circularia nos meios da imprensa que padecem da Síndrome de Miami: "Vários alunos cochilavam ou conversavam alegremente, mais preocupado com o sol, que já na primeira hora do dia golpeava suas cabeças, do que com o holocausto nuclear. O tema do discurso não pareceu inflamar as mentes dos jovens, que aplaudiram discretamente o homem que viram reger seus destinos durante toda a vida, e que os exortava para a 'batalha na luta pela paz'". Para estes meios de comunicação, parece mais importante desqualificar o apoio juvenil a Fidel, em Cuba, que o perigo real de uma conflagração nuclear.
Para que Cuba se autodestrua depois de Fidel - como desejam e incentivam -, deve haver uma ruptura entre a nova juventude cubana e os dirigentes históricos da Revolução. O encontro de ontem dissipou algumas dúvidas: os jovens cubanos não perderam a conexão, eles também sentem Fidel como seu guia moral, sabem que vivem momentos históricos. Embora a EFE, El Pais, El Mundo e RTVE, entre outros meios mancomunados, substituam a realidade pelo desejo.
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