sábado, 28 de agosto de 2010

Impressões sobre Cuba - O essencial e o trivial numa Revolução

Por Paulo Jonas de Lima Piva no blog O Pensador da Aldeia
 
Uma das características mais sedutoras das sociedades de consumo é a grande variedade de mercadorias e bugigangas à disposição de todos. À disposição de todos somente à primeira vista. Na prática, são acessíveis apenas aos quem têm dinheiro para comprá-las. Nesse paraíso das mercadorias tudo se torna mercadoria, inclusive saúde, educação, cultura e até informação. Nos EUA, modelo de sociedade de consumo, nem todo mundo que consome com facilidade, por exemplo, condicionador de cabelo ou absorvente, necessariamente pode desfrutar de atendimento médico, já que lá a saúde é paga, ou ingressar numa boa universidade, como Havard, que custa muito dinheiro e é projetada para as elites.

Já em Cuba a situação é inversa: os cubanos não pagam por consultas médicas ou tratamentos em hospitais de qualidade desde que Fidel Castro, Che Guevara e Camilo Cienfuegos desencadearam o processo revolucionário na ilha, ou seja, desde 1959. Mensalidade escolar, cobrança de matrícula para estudar ou carnê com as prestações da faculdade são inimagináveis em Cuba. Mais do que impensáveis, a idéia de que a educação possa ser tratada como mercadoria é, aos olhos do povo cubano, uma imoralidade.

Por outro lado, se educação e saúde em Cuba são bens triviais, abundantes até, a ponto do governo cubano, em convênios de solidariedade, enviar médicos e professores para as regiões mais carentes do planeta, o mesmo não ocorre com os produtos triviais, como condicionadores de cabelo, acetona e absorvente feminino. Por conta do bloqueio econômico imposto pelo governo estadunidense à ilha desde 1962, esses produtos, triviais nas sociedades de consumo, são privilégios na ilha socialista, do mesmo modo que são privilégios nas sociedades de consumo o que na ilha é trivial, isto é, saúde e educação. Quando chegam às prateleiras dos mercados e das farmácias, tais produtos são comprados de imediato pela população, mesmo a preços altos, uma vez que são importados e, por conta do bloqueio, adquiridos a taxas de importação bem mais elevadas do que o mercado internacional estabelece.

As causas de tal desabastecimento são, evidentemente, históricas. Muito se deve ao bloqueio estadunidense, porém, também à ingerência soviética e a erros da política de industrialização do país. Tais dificuldades diante do trivial, entretanto, forçam o povo cubano a usar a criatividade para supri-las. Se não há acetona, cuida-se das unhas de outra maneira. Já nas sociedades de consumo de imitação norte-americana, quando se tem uma doença grave e não se tem dinheiro para pagar uma consulta ou manter um tratamento caríssimo, tal situação não é tão simples como uma alternativa de manicure...

(Artigo publicado no jornal Gazeta Itapirense, de 28 de agosto de 2010)

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