Débora Radaelli Spader viajou para Cuba após conversar com amigos |
Por Roberta Mello no Jornal do Comércio
Conhecer um país estrangeiro com um olhar mais próximo possível da sua população, trabalhando e contribuindo para o desenvolvimento da economia local e passando bem longe do roteiro turístico tradicional. É assim que um número, cada vez maior, de brasileiros de todas as idades decidem viajar. A partir do chamado turismo social ou "voluntourism", que mistura a experiência de realizar um trabalho voluntário com a imersão na cultura de outro país.
Um dos programas de voluntariado internacional mais longevos é desenvolvido em Cuba pelo Instituto Cubano de Amistad con los Pueblos (Icap), vinculado ao governo. A primeira brigada - como são chamadas as comitivas internacionais de solidariedade - ocorreu na década de 1960 e foi organizada por norte-americanos que não concordavam com o até hoje polêmico bloqueio econômico instituído pelos Estados Unidos após a Revolução Cubana.
O programa dá continuidade a uma visão internacionalista presente no espírito cubano. A influência vem da ideologia do poeta e herói nacional José Martí e foi alimentada por Ernesto "Che" Guevara, que tratava o trabalho voluntário como uma "escola criadora de consciências".
A ida ao país caribenho atrai grupos de militantes de esquerda do mundo inteiro, inclusive de gaúchos interessados em conhecer a realidade de um país socialista e colaborar. No Rio Grande do Sul, quem deseja participar entra em contato com a Associação Cultural José Martí.
Nos meses anteriores à viagem são realizadas reuniões para compartilhar informações e planejar, por exemplo, o que será levado na mala além dos artigos de praxe. Entre os itens que não podem faltar na bagagem do brigadista estão as doações de material escolar ou de construção (há dificuldade em adquirir estes produtos por lá, devido ao embargo) e as comidas, artigos de decoração e instrumentos musicais bem brasileiros.
A publicitária Débora Radaelli Spader (foto) procurou a associação após conversar com amigos que já haviam participado. Para Débora, a viagem representou "uma nova maneira de ver o mundo, de interagir e de trocar experiências com pessoas interessantes, de me sentir útil e de estar contribuindo com um mundo melhor". Já a estudante de Direito Helena Boll rumou à terra de Fidel Castro em janeiro, integrando a delegação da 22ª Brigada Sul-Americana. Ela diz que um dos grandes aprendizados da viagem foi "o reconhecimento da diferença enquanto igualdade" e destaca a importância do trabalho feito pelos brigadistas nas cooperativas rurais. "Aprender um pouco mais, na prática, sobre a lida no campo foi importante, sobretudo, porque o trabalho daqueles camponeses está carregado de valores ideológicos", recorda.
Luiza Costa Gava também teve a oportunidade de viver durante 14 dias no Campamento Internacional Julio Antonio Mella (Cijam). Historiadora e estudante de Gestão de Turismo, Luiza vê uma mudança de paradigma com a diminuição do turismo de massa, tradicional. "O turismo social visa à promoção de igualdade de oportunidades e o exercício da cidadania. Se praticado de acordo com essas diretrizes, ele é um meio de inclusão das comunidades que recebem visitantes", sintetiza.
Mas nem só de trabalho vivem aqueles que partem para o voluntariado internacional. O acampamento cubano, por exemplo, contempla atividades educacionais, visita a locais turísticos, momentos livres e festas. O investimento total, com acomodação, refeições e passeios, é de 370 Pesos Convertibles Cubanos (CUC) - a moeda turística local, valor equivalente a aproximadamente R$ 1.600,00.
Locais com produção sustentável são os preferidos
Locais com produção sustentável são os preferidos
A estudante de Biologia Maria Eduarda Appel inseriu no roteiro de uma viagem pela América do Sul a passagem por uma fazenda no Valle del Elqui, no Chile. O contato com a propriedade foi mediado pela World Wide Opportunities on Organic Farms (WWOOF), que disponibiliza uma lista de plantações orgânicas de acordo com o destino do turista.
Maria Eduarda decidiu realizar o trabalho voluntário no país andino pela vontade de aprender mais sobre permacultura "e, principalmente, pela oportunidade de estar em uma fazenda pequena de uma família, sentindo sua relação com o alimento e com a natureza à sua volta". Ela e uma amiga ajudaram a montar o sistema de irrigação das árvores frutíferas.
Maria Eduarda diz que aprendeu que todas as situações e pessoas podem proporcionar algum tipo de aprendizado. "Estando em qualquer lugar diferente, o mais importante é estar de cabeça aberta e disposto a ajudar", indica.
A WWOOF está presente em mais de 99 países, incluindo o Brasil. A organização cobra uma taxa para o envio da lista de fazendas ao intercambista. A hospedagem e alimentação são pagas através do serviço prestado pelo voluntário.
Organizações tornam a viagem mais segura
Ter informações sobre o destino e estar o mais preparado possível para as adversidades é fundamental. Normalmente, os destinos escolhidos são países com baixo desenvolvimento econômico e/ou social, e procurar uma organização séria para fazer a interlocução é o mais indicado. Supervisora da região Sul da Central de Intercâmbio (CI), Ana Flora Bestetti adverte que "como são zonas deprimidas, é importante saber qual organização está mandando e qual está recebendo lá".
Felipe Villela tinha o sonho de conhecer o continente africano desde os cinco anos de idade. Com 22, decidiu procurar a CI e concretizá-lo. Foi na Namíbia que ele viveu aquilo que imaginava na infância.
Felipe trabalhou com elefantes selvagens durante um mês e teve "a melhor viagem de todas". Além disso, realizou trabalho voluntário em uma comunidade na África do Sul. "É claro que há um choque cultural, mas a riqueza humana é muito maior do que as dificuldades", afirma.
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