domingo, 11 de dezembro de 2011

Laços familiares alteram relações entre Cuba e Estados Unidos


*O Blog Solidários recomenda cuidado na leitura. 
Nova geração de cubanos no exterior supera ideologias e se aproxima de parentes na ilha comunista

Por dois anos consecutivos, Stephanie Varcia, de 11 anos, fez algo que, há cinco anos, seria inimaginável. Ela passou quatro semanas em Havana, brincando de esconde-esconde com seus primos e indo à praia com seus tios e tias. Quando as férias de verão terminaram, sua mãe foi de avião buscá-la, voltando com a menina para casa, em Miami.

A estada de Stephanie em Cuba – um ritual cada vez mais comum nas famílias, que hoje inclui viagens de menores desacompanhados à ilha – é um símbolo da profunda transformação no relacionamento entre cubano-americanos do sul da Flórida e cubanos de Cuba.

As férias da garota indicam mais que apenas um derretimento no amargo congelamento entre Cuba e Estados Unidos, que dura 50 anos. Trata-se de um reconhecimento, em muitos aspectos, de que a passagem do tempo e o desejo de estar com a família começaram a superar o cáustico impasse político que se seguiu à revolução comunista de Fidel Castro, em 1959.


Embora membros do Congresso no sul da Flórida ainda defendam uma linha dura em relação a Cuba, posição que soa bem junto a eleitores mais velhos (que têm mais probabilidade de realmente ir às urnas), a maioria dos cubano-americanos de Miami têm uma atitude menos rígida. Muitos deles preferem ver mais contato com as pessoas que estão em Cuba, não menos.

“A verdade é que o que motiva a política não é o relacionamento entre Estados Unidos e Cuba, mas entre cubanos, e isso é muito mais forte do que 50 anos de hostilidade entre governos”, disse Joe Garcia, ex-presidente do Partido Demo­­crático de Miami. “Quan­­do se removem apenas algumas barreiras, as pessoas fazem o que fazem: ajudam suas famílias”.

Apesar do embargo comercial e econômico dos Estados Unidos, imposto em 1960, os laços entre as duas populações cubanas começaram a mudar lentamente há uma década, e se intensificaram nos últimos dois anos – resultado da atitude do governo de Obama de afrouxar as restrições a viagens e envios de mercadoria, em 2009. Decisões recentes tomadas pelo governo de Cuba, permitindo que os cubanos possuam celulares e computadores, abram pequenas empresas e comprem e vendam carros e imóveis, solidificaram ainda mais esses laços.

No entanto, a maior razão para essa reviravolta é a mudança do perfil dos cubano-americanos no sul da Flórida. Estima-se que haja cerca de 300 mil cubano-americanos nos Estados Unidos que chegaram após meados da década de 1990, a maioria através de um programa especial de visto. Hoje, eles superam em número os exilados cubanos da década de 1960, disse Jaime Suchlicki, diretor do Instituto para Estudos Cubanos e Cubano-Americanos da Universidade de Miami.

Ao contrário dos exilados que fugiram de Cuba nos anos 1960 e 1970, deixando para trás propriedades, famílias e seu país natal, essa rede de familiares imediatos da geração mais nova em Cuba é forte e ampla.

Assim, embora eles se oponham a Castro e enxerguem bem os fracassos de Cuba, a família é sua prioridade, não política ou ideologias. O mesmo vale até para alguns cubano-americanos das gerações anteriores que perderam a paciência com a longevidade de Castro e com um embargo de 50 anos que não teve sucesso em derrubá-lo.

“Os que chegaram mais recentemente não aceitam o isolamento e o confronto, porque isso significa isolar seus parentes”, disse Fernand Amandi, da Bendixen & Amandi Interna­­tional, empresa de pesquisa de opinião pública de Miami. “Assim, os laços são muito mais próximos hoje, de pessoa para pessoa”.



Viagens

Número de voos para a ilha aumenta a cada ano

Os Estados Unidos já não limitam mais o número de voos para Cuba. No ano passado, 320 mil pessoas, um número recorde, viajaram em voos fretados de Miami para Cuba, de acordo com dados do Departamento de Aviação de Miami-Dade, muitos deles parte de uma geração mais jovem de cubano-americanos avessos à política.

Neste ano, espera-se que o número seja maior. Alguns dos passageiros viajam várias vezes por ano, visitando o país para assistir a casamentos, participar de festas de aniversário e tirar férias. Eles mantêm contato através do celular, e-mail (a internet ainda é fortemente controlada, mas alguns cubanos usam conexões em universidades e cybercafés em hotéis) e até mesmo mensagens de texto (que podem ser encaminhadas via um terceiro país).

Pela primeira vez, os cubano-americanos podem enviar “pacotes de presentes”, grandes envios de não apenas comida, roupas e remédios, mas uma variedade de itens que suas famílias em Cuba podem usar para tocar pequenas empresas privadas.

As ferramentas, pneus, acessórios de Nintendo, latas de óleo de cozinha e suprimentos de padaria enviados do sul da Flórida formam o alicerce das marcenarias, oficinas de troca de pneus, lan houses, restaurantes e padarias da ilha. E a nova lei que permite aos cubanos comprar e vender propriedades deve levar a milhares de dólares à ilha, canalizados dos expatriados aos seus parentes.


Imigrantes em Miami agitam vida cultural

A transformação nas relações com cubanos que vivem nos Estados Unidos também é palpável em outros aspectos. Antes ridicularizada por sua intolerância, a comunidade cubana em Miami agora recebe artistas da ilha, com pouco alvoroço.

Há dez anos, esses mesmos músicos, confrontados por protestos, foram forçados a desviar da cidade. Hoje, o Ache, uma casa noturna que fica em frente do Versailles – o centro da política dos exilados, onde o sentimento anti-Castro é servido com cafezinhos – recebe músicos cubanos.

Los Van Van, uma conhecida banda, fez uma barulhenta apresentação na cidade em setembro, em grande parte para antigos fãs. Em 1999, a banda cancelou um show em Miami por conta do furor. O Versailles e a propriedade onde fica o Ache pertence aos Vall, uma família de restaurateurs conhecida entre os exilados.

O mesmo pode-se dizer de Pablo Minales, famoso cantor cubano que é agressivamente odiado pelos exilados de Cuba. Ele fez sua primeira visita a Miami este verão.

Até mesmo a televisão local em espanhol tem se adaptado. Antes, ela apresentava constantes debates afiados sobre Cuba e um desfile de desertores e espiões. Mas os índices de audiência começaram a cair recentemente, disse Roberto Cespedes, produtor de A Mano Limpia, um programa popular na estação independente WJAN-CA. Agora o programa também mostra reportagens sobre o Afeganistão, criminalidade e águas-vivas – em outras palavras, notícias gerais.

“Em Washington, todo o debate ao redor da normalização das relações em Cuba está praticamente morto”, afirma Philip Peters, especialista em Cuba do Lexington Institute. “Eles [os cubano-americanos] estão se tornando uma comunidade de imigrantes, que, como outros imigrantes nos EUA, ajudam aqueles que ficaram em casa. E eles fazem isso independentemente da política”.




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