quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Yoani Sánchez: "heroína" de uma causa sem pátria

Por Fernando Mousinho*

O governo brasileiro acaba de conceder visto de turista para que a blogueira cubana Yoani Sánchez venha ao Brasil. Ela é considerada por setores da mídia internacional como “uma jovem liderança de oposição ao regime de Fidel Castro” ou, simplesmente, “dissidente cubana”. No Brasil, a blogueira terá mais o que explicar do que condenar.

A história nos tem dado grandes líderes, heróis e patriotas consagrados e legitimados pela dedicação às causas mais nobres dos seus povos. Sóror Joana Angélica e Mao Tsé-Tung entre eles. Ela, assassinada a golpes de baionetas por soldados portugueses às portas do Convento da Lapa, em Salvador, por defender os anseios independentistas do povo brasileiro frente ao colonizador. Ele, condutor de uma massa de camponeses miseráveis que libertou seu país do jugo medieval em pleno século 20 e construiu a potência que é a China hoje.

Exalto esses casos na tentativa de entender a razão da notoriedade publicitária internacional que vem recebendo a blogueira Yoani Sánchez, que se auto-denomina “patriota” e “defensora dos direitos humanos”. E, particularmente, por ela estar às portas do Brasil.

No seu blog ela registra, com relação a Cuba: “uma imensa prisão com muros ideológicos”. Um “barco que faz água a ponto de naufragar”. Yoani é uma havaneira nascida em 1975, e graduada em filologia pela Universidade de Havana em 2000. Em 2002, migrou para a Suíça face ao “desencanto e à asfixia econômica” que reinava na Ilha, segundo registra no blog. Em 2004, decide deixar o paraíso suíço, uma das nações mais ricas do mundo, para regressar ao ‘barco furado’. Diz ainda que resolveu regressar a Cuba, onde reinam “os gritos do déspota” e “seres das sombras, que como vampiros se alimentam de nossa alegria humana, nos inoculam o temor através de golpes, da ameaça, da chantagem” por motivos familiares. Apesar de contrariar a opinião de conhecidos e amigos”: “Não entendo teu regresso. Por que não deste um futuro melhor ao teu filho?”.

“Estimada amiga, quisera saber o motivo pelo qual decidiste regressar a Cuba”. Ao que ela própria comenta: “Meus amigos pensaram que lhes contava uma piada, minha mãe se negou a aceitar que sua filha já não vivia na Suíça do leite e do chocolate”.

Na Suíça, Yoani teve grandes dificuldades de arranjar emprego e viver decentemente. Por isso, desesperada, resolveu voltar a Cuba e explicar as razões disso às autoridades locais. Segundo estas, Yoani haveria suplicado, em lágrimas, ao serviço de imigração, que lhe concedesse uma dispensa excepcional “para revogar seu estatuto migratório”. O que lhe foi concedido.

Leneide Duarte-Plon, jornalista francesa, em artigo de 12/01/2010, logo após ter regressado de Cuba, é categórica em relação a Yoani: “Ela tem que comprar cartões em hotéis de turistas pagando até 10 pesos conversíveis por uma hora de conexão (cada euro é trocado por 1,27 pesos ou CUC), como eu mesma tive que pagar para ler meus e-mails durante os nove dias que passamos em Cuba.

Acontece que, segundo Yoani, uma hora de conexão paga num hotel representa um terço de salário mensal de um cubano médio. Ela não explica de onde tira o dinheiro para se conectar uma vez por semana de um hotel da capital, já que que se diz formada em filologia, mas sem nenhum trabalho além de seu blog.

Diante de tantas contradições, creio que já é hora de indagarmos: cuál es la tuya, Yoani? Diz-me com quem tu andas, que eu te direi quem és. É sagrado, tá na Bíblia!?

Sobre o fato, argumenta Frei Beto: “O portal Generación Y, de Yoani Sánchez, é altamente sofisticado, com entradas para o Facebook e Twitter. Recebe 14 milhões de visitas por mês e está disponível em 18 idiomas. Nem o Departamento de Estado dos Estados Unidos dispõe de tanta variedade linguística. Quem paga os tradutores no exterior? Quem financia o alto custo de 14 milhões de entradas”?

A blogueira noticiou ao mundo que teria sido agredida nas ruas de Havana. Três dias depois do ocorrido ela recebeu em sua casa a imprensa estrangeira, relata Frei Beto: “Fernando Ravsberg, da BBC, notou que, apesar de todas as torturas descritas por ela, ‘não havia sintomas, marcas ou cicatrizes’” (BBC Mundo, 9/11/2009). O que foi confirmado pelas imagens da CNN. A France Press divulgou que ela ‘não foi ferida’. Yoani declarou que as marcas e hematomas haviam desaparecido (em apenas 48 horas!), exceto nas nádegas, ‘que lamentavelmente não posso mostrar’. Ora, por que, no mesmo dia do suposto sequestro, não mostrou por seu blog, repleto de fotos, as que afirmou ter nas outras partes do corpo”? Mais contradição, portanto.

Ora, mas tanto José Marti como Fidel Castro fez propaganda no exterior de suas respectivas Revoluções. Só que com uma pequena diferença, em ambos os casos a participação popular consciente dava legitimidade à obra dos dois Comandantes.

Ao que tudo indica a “blogueira” não se insere na classe de patriotas a que nos referimos, não. Diferentemente deles, ela não esta amparada em alguma causa popular, e muito menos tem povo ao seu lado. Pretenciosa, certamente ela está querendo ser a um só tempo dirigente e força motriz da história. Qual foi o trabalho social ou popular prestado por ela ao povo cubano? Ela não passa de uma farsa propagandista de novo tipo. É apenas mais uma lucubração perversa dos intervencionistas de sempre: Os Estados Unidos da América, que têm sete léguas nas botas, como nos ensinou José Marti, exemplo de Patriota, “o maior precursor da Revolução Cubana”, sentenciou Alejo Carpentier.

O “Cavaleiro Andante”, Dom Quixote de La Mancha, ao menos tinha ao seu lado o sonso Sancho Pança. E muito mais. Dom Quixote representa o lado espiritual, sublime e nobre da natureza humana. Qualidades inexistentes na artificial e alienígena blogueira que os detratores da Revolução Cubana tentam apendicular à história recente da Ilha.

Cínica e hipócrita, não reconhece um único avanço da Revolução Cubana. A mortalidade infantil é de 4,9 e a expectativa de vida é de 77 anos. Índices superiores a países como EUA, Japão e Dinamarca. Desconhece que Cuba está entre as dez maiores potências olímpicas do mundo e livre do analfabetismo desde os primeiros anos da Revolução. Anteriormente, só em Havana o número de prostitutas ultrapassava os 100 mil – hoje, mais de 50% da mão de obra técnica e científica do país, é feminina. O único computador existente servia apenas para monitorar corridas de cachorro.

Certamente também não a sensibiliza o fato de que entre as mais de 200 milhões de crianças que hoje dormirão nas ruas do mundo, nenhuma delas é cubana. Ou isso não é um caso de Direitos Humanos?

Direitos Humanos, sobre o que ela mais fala, é o que ela menos conhece. Se patriota fosse e com os Direitos Humanos estivesse comprometida, seria ela a primeira a levantar a bandeira contra os mais de 50 anos do desumano bloqueio dos EUA contra Cuba, o mais antigo da história da humanidade.

Certamente ela também desconhece que a Assembleia Geral da ONU, pela 20ª vez consecutiva, condenou e pediu o fim do bloqueio dos EUA a Cuba. Incauta, não se dá conta que entre junho de 2010 e junho de 2011, o cubano Rodolfo Reys Rodriguez exerceu o mandato de Vice-Presidente do Conselho de Direitos Humanos da ONU, eleito que foi por aclamação.

São respostas contundentes da comunidade internacional aos falsos patriotas e à reacionária mídia internacional que insiste em dar conotação de presos políticos a quem cometeu crime comum e sua pertinaz cruzada contra a Revolução Cubana.
A base militar norte-americana em território cubano invadido e sua prisão de torturas de Guantánamo, para ela, certamente também não são Direitos Humanos.

Encantada pelas suas idas e vindas à Seção de Interesses dos EUA em Havana, de quem já teria embolsado mais de 300 mil euros, ela não se dá conta do prejuízo causado pelo caráter de extraterritorialidade da Lei norte-americana Helms-Burton ao seu país – navio de qualquer nacionalidade que entrar em porto cubano, fica impedido de atracar em portos dos EUA, diz a Lei, dentre muitas outras aberrações contra o Direito Internacional e a Soberania dos Povos.

Durante a passagem da subsecretária de Estado adjunta dos EUA para a América Latina, Bisa Williams, por Havana, esta foi surpreendida pela insólita solicitação da blogueira: “levantar as restrições que a impedem de fazer compras pela Internet”. É, depois de vender-se, nada melhor do que ir às compras.

O fato de Posada Carriles, terrorista cubano, nacionalizado venezuelano, agente da CIA, haver colocado bombas em hotéis de Havana e em um avião da Cubana de Aviación, em pleno ar, em 1976, em Barbados, com 73 pessoas (a maioria jovens cubanos e coreanos atletas de esgrima), e hoje perambular lépido e fagueiro pelas ruas de Miami, também não deve ser considerado por ela uma questão de Direitos Humanos. Por fim, Direitos Humanos seletivos é aquilo a que ela se dedica, seguramente.

Displicente com a história do país que a viu nascer, talvez não lhe tenha chegado aos ouvidos o Grito de Yara, a guerra pátria contra a colonização espanhola, deflagrada pelo latifundiário patriota Carlos Manuel de Céspedes, o Pai da Pátria. Nela, destacou-se, por seu heroísmo, a negra africana Carlota, que à frente de outros negros comandou o incêndio dos canaviais do colonizador. Muito menos a figura de José Marti, patriota e herói da independência de Cuba, deve merecer sua atenção.

Na História de Cuba, nada relativo à sua independência e soberania acontece sem a participação e união de todo o povo. Portanto, não seria agora, diante da Revolução dirigida por Fidel Castro, vitoriosa na invasão da Baía dos Porcos, patrocinada pelos EUA, e que superou o Período Especial, que o povo cubano, escola de homens e mulheres líderes, heróis e patriotas, iria cair no canto da sereia de marujos de primeira viagem que desconhecem a trajetória, a convicção e a dignidade de uma Revolução gloriosa.

* Fernando Mousinho é sociólogo e assessor do PSB na Câmara dos Deputados.

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