Por Patricia Grogg, da IPS
Mais de uma centena de cooperativas de fora do setor agropecuário
ampliaram o setor independente da economia cubana, que inclui trabalho
por conta própria e posse da terra em usufruto, dentro de uma política
definida pelo governo, de modernização da gestão da propriedade estatal.
As autoridades defenderam a propriedade social sobre os meios
fundamentais de produção como aspecto essencial do modelo que se
constrói a partir das mudanças constantes nas Diretrizes da Política
Econômica e Social do governante Partido Comunista de Cuba e a
Revolução, mapa para a atualização do modelo impulsionada pelo
presidente Raúl Castro.
Nos debates parlamentares do mês passado em Havana, nos quais este
tema estava incluído, o vice-presidente do Conselho de Ministros, Marino
Murillo, explicou que as transformações objetivam construir um
socialismo próspero e sustentável, no qual a principal protagonista será
a empresa estatal, fortalecida com maior autonomia de gestão e na
distribuição de seus resultados.
“Socialismo pressupõe propriedade social sobre os principais meios de
produção; próspero significa estado de bem-estar; sustentável é
sinônimo de desenvolvimento, porque sem ele não se sustenta nada”,
detalhou Murillo, também chefe da Comissão de Implantação das
Diretrizes, a maior responsabilidade neste processo de modernização da
economia empreendido oficialmente em 2011.
Analistas ouvidos pela IPS consideram a abertura de 124 cooperativas
fora do setor agropecuário um dos mais “ousados” passos do governo de
Castro, já que 112 destas novas entidades eram estatais e estão chamadas
a serem mais eficientes do que suas antecessoras. Esta forma de gestão
só era permitida até agora no setor agrícola.
Por setores, 99 se dedicarão ao mercado agropecuário, 12 funcionarão
como brigadas da construção, cinco no transporte de passageiros,
incluído o escolar, seis em reparos, serralheria e outros serviços do
transporte, e as duas restantes à reciclagem e recuperação de
matérias-primas. Proximamente outras 71 se somarão a estas.
Em discurso transmitido ao final dos debates de julho, Raúl Castro
assegurou que seu governo apoiará decididamente a criação de
cooperativas não agropecuárias, as quais, junto do trabalho por conta
própria, “ajudarão o Estado a se liberar das atividades produtivas e de
serviços não fundamentais para se concentrar no programa de
desenvolvimento de longo prazo”.
Contudo, observa-se uma cautela especial nesse processo, porque essas
primeiras cooperativas não agropecuárias operarão inicialmente somente
nas províncias de Havana e suas vizinhas Artemisa e Mayabeque. Conforme
for seu desenvolvimento, a experiência poderá se estender ao restante do
país. Estas cooperativas possuem personalidade jurídica e patrimônio
próprios, usam, desfrutam e dispõem de seus bens, e também podem
empregar qualquer outro meio do Estado que este conceder em
arrendamento. Seu órgão máximo de direção é a assembleia geral, na qual
cada sócio tem um voto.
Murillo disse que os autônomos, que em setembro de 2010 somavam
157.037 registrados, no mês passado chegavam a 429.458. Em 2008, o
governo iniciou a entrega em usufruto de terras ociosas, embora, apesar
da autorização para construir moradias nas áreas recebidas, entre outras
medidas, suas produções continuam baixas. Dados recentes indicam que
são 176 mil usufrutuários, para os quais, mediante o Decreto Lei 300, de
dezembro passado, foi ampliado de 40 para 67 hectares o limite máximo
de terras a serem entregues.
O Centro de Controle da Terra garante que já cedeu em usufruto 1,5
milhão de hectares estatais sem cultivar e dispõe de outros 975 mil para
prosseguir o programa, cujo objetivo é aumentar o rendimento
agropecuário e a produção de alimentos. Apesar destas e outras medidas, o
setor agropecuário não consegue rendimentos suficientes para atender as
necessidades do país, que, se prevê, tenha de pagar, ao final deste
ano, uma conta de US$ 2 bilhões pela importação de alimentos. “Faz falta
liberalizar mais as forças produtivas”, limitou-se a dizer à IPS um
especialista em temas agrários.
Segundo essa fonte, a agricultura em Cuba absorve 20% do emprego
total e sua contribuição direta para o produto interno bruto é inferior a
5%, já que é onde existe a menor produtividade do país. “Ainda falta um
longo caminho para percorrer, onde o que é realizado não corresponde
aos resultados produtivos”, pontuou o especialista. A alimentação
provoca os maiores gastos da família cubana média, em cuja economia
passou inadvertido o crescimento de 2,3% do PIB no primeiro semestre
deste ano, reconheceu Castro ao final das sessões parlamentares.
Projeta-se que a expansão da economia oscile entre 2,5% e 3% no final
deste ano.
Raúl Castro alertou que um clima de ordem, disciplina e exigência da
sociedade cubana é “premissa imprescindível para consolidar o avanço da
atualização do modelo econômico e não admitir retrocessos
contraproducentes”. A esse respeito, exortou a população a somar-se à
luta contra “o clima de indisciplina que se arraigou” na sociedade do
país e “causa danos morais e materiais nada desprezíveis”. A seu ver,
esse enfrentamento não deve ser mais uma campanha, mas “um movimento
permanente”. Castro afirmou que “temos visto com dor, ao longo dos mais
de 20 anos de período especial, a elevada deterioração dos valores
morais e cívicos, como honestidade, decência, vergonha, decoro, honradez
e sensibilidade diante dos problemas dos demais”.
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