quarta-feira, 26 de setembro de 2012

UM DESAFIO AO JORNALISMO (II)

Por Ricardo Alarcón de Quesada (Presidente do Parlamento cubano)
Fonte: GRANMA

• O julgamento mais longo da História concluiu com o veredicto mais rápido
• A grande ironia do caso dos Cinco parece ser seu relacionamento com a mídia.
Em Miami, o caso teve uma cobertura desmedida e os “jornalistas” e a mídia local foram instrumentos chaves para criar um ambiente de ódio irracional, que condicionaria um resultado pré-estabelecido pelo governo. Os supostos profissionais da imprensa distorceram os fatos, mentiram e fabricaram uma imagem que mostrava os acusados como ameaças iminentes para a comunidade. Em sua condição de assalariados encobertos do governo, os tais “jornalistas” cumpriram com o que orientou aquele que lhes pagava.

Coordenaram sua atividade com a Procuradoria e com os grupos terroristas, mesmo a partir da fase de seleção do júri e fizeram isso especialmente para introduzir, mais de sete meses depois da detenção, uma nova e totalmente inventada acusação de “conspiração para cometer assassinato”. Ao redor desta infame calúnia girou a maior parte do julgamento e da atenção da mídia. O júri foi assediado constantemente por entrevistas coletivas e declarações à imprensa de colegas e familiares das vítimas, realizadas perante eles, à entrada e à saída do tribunal. Depois, assistiriam de novo esses materiais através da rádio e da televisão. Em seus próprios lares também podiam ver-se a si próprios perseguidos por câmeras e microfones, quando abandonavam a sede da Corte.

Além de Miami, o processo dos Cinco não atraiu o interesse das grandes corporações da informação. Do caso não se falou nos despachos das agências, não apareceu nas publicações impressas nem na rádio e na televisão fora da Flórida. Não encontrou espaço uma só vez, nem nos canais de televisão dedicados exclusivamente aos tribunais, que transmitem vinte e quatro horas diárias nos Estados Unidos.


Como explicar esse desinteresse? Era, então, o julgamento mais prolongado na história dos Estados Unidos; nele compareceram como testemunhas, generais, coronéis, oficiais de alta patente e expertos militares, um almirante e um assessor do presidente da República; conotados terroristas desfilaram perante a Corte, e se identificaram como tais, alguns envergando indumentária guerreira. Tratava-se dum pleito que implicava as relações internacionais e questões vinculadas, real ou supostamente, com a segurança nacional e o terrorismo, tópicos prediletos da grande mídia. Mas ninguém disse nada, além da imprensa local, para o resto da gente o julgamento simplesmente não existiu.

Ignoraram o tema fora de Miami, embora seus correspondentes e emissoras filiais nesse lugar noticiassem todos os dias e participassem com entusiasmo no frenesi midiático que transbordou a cidade.

A ferrenha censura imposta a este caso permitiu a assombrosa impunidade com a que as autoridades protegeram os terroristas e puniram, injusta e cruelmente, cinco homens que os enfrentaram heroicamente, desarmados, sem utilizar a violência, sem causar dano a ninguém. A Procuradoria nunca escondeu que esse era seu propósito. Disse isso com todas as letras, muitas vezes, como consta nas atas do processo, sem preocupação alguma porque confiava no rigoroso silêncio da grande mídia, porque sabia que o público normalmente não lê as transcrições oficiais nem assiste às sessões do tribunal e sabem o que ali ocorre apenas pelas versões jornalísticas.

Os júris, por seu lado, viam cada dia, durante mais de meio ano, que na sala do tribunal os procuradores falavam amistosamente com testemunhas que alardeavam de sua militância violenta e sua trajetória terrorista, escutavam as fortes arengas de alguns e as ameaçadoras perorações dos outros.

Ao retornar a sua casa com sua família e seus vizinhos, as mesmas imagens os acossavam. Eram rostos e vozes conhecidas.

Pouco antes, tinham sido mostrados pela mesma mídia, quando sequestraram um menino de seis anos, Elián González, desafiaram o governo federal e seus juízes, criaram o caos na cidade e ameaçaram de incendiá-la. Lembravam que ninguém foi punido nem enviado perante nenhum tribunal. Os júris tinham sido testemunhas daquela insólita impunidade e temiam que se repetisse e agora fosse contra eles, caso não dessem o veredicto exigido pela turba e assim o confessaram muitas vezes, quando foram entrevistados durante o processo de seleção do júri. Estavam com medo.

E o medo aumentou depois, segundo passavam aqueles longos meses e crescia, cada vez mais, quando eram perseguidos pelos “jornalistas” com suas luzes e seus microfones. Muitas vezes se queixaram e a juíza lhes deu a razão, mas tudo continuou igual.

Os procuradores, por seu lado, repetiam até o cansaço que eles, os júris, tinham uma grave responsabilidade, deles dependia, somente, a sobrevivência dos Estados Unidos e dessa comunidade que os estava assistindo.

Estavam com medo e se sentiam abandonados. Nem uma só voz se levantou na mídia local para defendê-los e chamar ao sossego e à prudência. Queriam, sobretudo, terminar com aquele maldito julgamento, retornar a casa e serem esquecidos.


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