terça-feira, 21 de maio de 2013

Convenção de solidariedade a Cuba em Ipatinga: por dever de gratidão!


Por Robinson Ayres

No dia 18 de maio, de 8h às 18h, aconteceu, no 7° andar da Prefeitura Municipal de Ipatinga, a Convenção Estadual de Solidariedade a Cuba, 2013. Em seu encerramento, uma atividade cultural na Área da Feirarte. Uma alegre noite de salsa, típica música cubana, animada por “La Noche Cubana”, banda de BH.

Quando os companheiros da Casa Latina-BH me procuraram e propuseram que a Convenção Estadual de Solidariedade a Cuba acontecesse em Ipatinga, num esforço de descentralizar sua realização, tirando-a de BH e levando-a para o interior do Estado, não pude me recusar a colaborar. Mais que por um sentimento abstrato de solidariedade, Ipatinga deveria se empenhar na manifestação de sua solidariedade ao povo cubano por um simples dever de gratidão. Afinal, quando organizamos o Mova-Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos de Ipatinga, nossa Cidade ostentava índices de analfabetismo assustadores, chegando a beirar os 25%, isso lá pelo ano de 1990. Com a implementação do Mova, hoje, 23 anos depois, Ipatinga figura entre os municípios mais alfabetizados de Minas Gerais e do Brasil. E o Mova foi organizado sob a inspiração do pensamento de Paulo Freire e do movimento de erradicação do analfabetismo desenvolvido em Cuba, imediatamente após a revolução de 1959. O Mova foi desenvolvido com o acompanhamento direto de Maria Dolores Ortiz, minha amiga e educadora Cubana, hoje com seus quase noventa anos, que, ainda jovem, participou daquele movimento. Maria Dolores esteve em Ipatinga, por duas vezes, dialogando conosco, avaliando nosso projeto e nos iluminando com sua experiência prática e competência teórica; e com o que mais a distingue, sua extrema ternura, quando estávamos construindo o Mova. Na festa de lançamento do Mova, lá estava Maria Dolores, no campo do Ideal, no Bom Jardim, acompanhando um Jogo de futebol de atletas veteranos, dentre eles Reinaldo e Romeu, ex-jogadores do Atlético Mineiro, que estiveram aqui, a nosso convite. Eu, médio volante, com óculos amarrados à nuca e Chico Ferramenta, um ponta-direita, que o time não poderia entrar incompleto. E, ainda me lembro, ali no Trevo do Panorama, Maria Dolores, colocada na carroceria de um caminhão, garoa persistente sobre as nossas cabeças, falando para um pequeno grupo de pessoas. Em Espanhol, e o sotaque cubano, mas o que ela nos queria dizer se traduzia numa linguagem universal por isso de fácil entendimento: Sigam, vamos em frente!

Além disso, não sei se do conhecimento de muitos, mas inúmeros profissionais aqui da nossa Cidade e Região, fizeram seus cursos de pós-graduações e seus mestrados, sobretudo na áreas de Saúde e Educação, em Universidades Cubanas. Professores cubanos aqui, defesas de teses em Havana. Quantos?

Se fosse apenas isso... Mas não só. Jovens de Ipatinga, bolsistas do governo estudam medicina em Cuba. Encaminhados pela Thema-Programas e Projetos Alterativos, ONG de mais de 18 anos de existência, de que sou um dos fundadores. Por isso, fazer a convenção em Ipatinga era uma questão elementar de gratidão. Não se careciam de outras razões, só essa, era mais que suficiente. Gratidão. Reconhecimento. Agradecimento. Non más!

1. Em Defesa da Autodeterminação dos Povos: Cuba tem Direito de escolher o seu caminho


Não fossem aquelas razões mais particulares que nos obrigam à gratidão, motivos mais fortes nos impõem a defesa do Direito do povo cubano seguir o seu próprio caminho. A derrota de Cuba será a derrota de uma experiência decisiva no caminho de todos os que lutam por um outro mundo, melhor e possível. Não fossem aquelas razões específicas, portanto, Ipatinga, cidade operária, teríamos essas, mais universais, a nos obrigar. Convenção em Ipatinga, um dever de gratidão em defesa da autodeterminação dos povos e do exemplo de Cuba.

Desde janeiro de 1959, quando um grupo de revolucionários com total apoio do povo cubano derrubou a ditadura sanguinária de Fulgêncio Batista e libertou o país da opressão imperialista dos Estados Unidos, Cuba segue construindo uma nova sociedade igualitária, livre da exploração do homem pelo homem. Já são 54 anos de resistência, de uma vida digna e de conquistas e direitos para todos os cubanos. Mesmo na pobreza material que o Império do Norte tenta-lhe impor como destino, submetendo a Ilha ao torniquete de um cruel bloqueio econômico, o povo cubano segue construindo uma sociedade igualitária. Construindo uma revolução que inspira a esperança para todos os povos da América Latina.

São 8,5 milhões de crianças vivendo como escravas no mundo, nenhuma é cubana. São 200 milhões de crianças e adolescentes que dormem na rua por esse mundo a fora, nenhuma é cubana. São milhões e milhões de crianças desnutridas no mundo, nenhuma é cubana. Sem contar que 93% da população cubana tem o ensino médio e 100% o ensino fundamental. Em Cuba ninguém se automedica, todos têm atenção adequada à sua saúde, atenção de qualidade e gratuita.Todos têm onde morar e o que comer. Todos têm segurança pública, como direito do cidadão. Recentemente, a própria FAO/ONU parabenizou o Governo Cubano por ter antecipado a meta do milênio para 2015 e erradicado a desnutrição em todas as faixas populacionais, em 2013. Não quero ser pessimista, mas se as coisas não mudarem, chega 2015, chega 2050 e tempo afora e só Cuba terá realizado as metas do milênio.

Quanto à forma de os cubanos gerirem o seu destino, antes de formularmos qualquer juízo de valor, temos o dever de assumir que isso é coisa dos cubanos, que têm, exigem e lutam pelo direito de decidirem o seu destino e tocá-lo com suas próprias mãos. E respeitamos porque somos pela autodeterminação de todos os povos.

Guantánamo em pleno território da Ilha expõe as vísceras do Império do Norte, mostra do que é feita a alma do mundo do tio Sam, de que ela se sustenta, como é nutrido o tal american way of life. Cuba não exporta armas, nem tampouco violências reacionárias, guerras, terror, tortura.

Cuba exporta solidariedade, aquele sentimento que faz nossos os sofrimentos dos outros e não admite que a felicidade exista quando a infelicidade está morando parede-e-meia. Cuba exporta compaixão, sentimento que distingue os homens das outras espécies de animais. Cuba exporta educação, bem como saúde, já que cada vez mais demonstra avançados conhecimentos nessa área. Cuba exporta, como no caso dos 6 mil médicos que virão para o Brasil, o que o Conselho Federal de Medicina, com seu corporativismo, e os imperialistas do norte mais temem: Cuba exporta o seu exemplo de povo heróico. Povo que mesmo não sendo dono de muita coisa, é dono de seu próprio nariz. Povo que teima em construir uma sociedade igualitária, ainda que baseada na pobreza, mirando desde Havana os reflexos das luzes e tentações de Miami. Apostando no futuro que teima em edificar, resistem. Resistem, nos mostrando um jeito de ser e andar quando se quer traçar com os dedos e plantas dos pés o seu próprio caminho. Esse exemplo é que tanto ameaça o império do norte e seus serviçais.

Um pequeno povo, 13 milhões de habitantes, um pouco mais, se tanto, pobre, mas que nos diz, desde 1959, ainda exausto pela vitoriosa batalha de “Playa Girón”, em alto e bom som: se nós pobres podemos fazer tanta justiça e construir tanta dignidade na carne e no espírito de um povo, o que não se pode fazer com tanta riqueza mal distribuída na face da terra.Vocês que são ricos, se mais ricos com o nosso exemplo, com certeza, poderão fazer muito mais e melhor. Só isso. Esse o exemplo que defendemos e em que miramos. Exemplo que os velhos yankees tanto temem. E as grandes corporações e impérios midiáticos sabotam e tentam domesticar e derrotar.

Mas, Cuba também importa e abre suas portas para os que sinceramente desejam um mundo melhor e para todos os sentimentos que nos tornam mais humanos e constroem o bem de toda a gente. Cuba importa muitos jovens de todo o mundo, dentre eles Janaina, Rômulo e Flávio Júnior, aqui de Ipatinga, para, através deles, compartilhar conosco o que o pequeno país acumulou de conhecimentos, dando-lhes a mesma formação em ciências médicas e humanidades que dá a seus filhos, os filhos da terra.

Cuba, desde Havana, mira Miami e, como coletivo, resiste às tentações de uma sociedade consumista, mundo de gafanhotos, vorazes predadores; o Povo Cubano, sabe que o mundo lhes reserva tempos de terras de Canaã, bastando resistir persistir lutar até que o tempo se construa, ao toque de nossas mãos, para que jorre o leite e o mel.
Miami também, se olha e olha também para o lado da ilha. Um capital, quero ver quanto me rende! Difícil explicar-se. Que racionalidade é essa que, desprezando o humano, constrói, com a miséria parede-e-meia, imorais bolsões de riqueza, fausto e dissipação? A lógica é simples, enquanto uns choram, outros vendem lenços. Onde tudo tem seu preço, até almas são postas em leilão.
Na Convenção, Beto Almeida, representante da Telesur no Brasil, lembrou que Nelson Mandela agradece a Cuba sua participação decisiva na luta contra o apartheid. Mandela diz que sem a participação dos combatentes Cubanos o apartheid não teria sido derrotado. Sobre isso, Fidel comenta: De lá, não trouxemos uma pedra de diamante, sequer. De lá, somente trouxemos os nossos mortos.

Beto também lembra a epidemia de meningite que ameaçava a África, em 2006. A OMS apela para todos os laboratórios do Mundo para que produzam vacina. A negativa foi geral. Não era um bom negócio. Não importava salvar vida, importava a taxa de retorno do Capital. Somente dois laboratórios no mundo aceitaram o desafio. O Instituto Finlay, de Cuba, e o instituto Bio-Manguinhos, da Fiocruz, o primeiro, Cubano e o segundo, brasileiro. Os dois, em parceria produziram a vacina e salvaram os milhões de vida que para a iniciativa privada era uma perda inevitável quando salvá-las não se mostrava um negócio lucrativo.

Solidarizamos com um povo que resiste na definição de seu próprio caminho, constrói igualdade na pobreza, exporta gestos de tamanho e humanitário desprendimento. Não exporta guerras e violências reacionárias. Exporta médicos, vacinas, educação, importa e forma pessoas para o mundo todo. Exporta dignidade.

É para ajudar a organizar e avançar um forte movimento de solidariedade a esse povo, movimento em defesa de seu exemplo e reafirmar a importância da unidade latino-americana para os destinos de nossos povos; para lutar contra o criminoso bloqueio econômico a que os EEUU submetem Cuba há 54 anos. Punindo-o por querer o seu próprio caminho, esse o único crime do povo cubano; para combater a campanha midiática imperialista contra Cuba e a Venezuela e organizar uma grande campanha pela liberdade dos cinco patriotas antiterroristas cubanos presos injustamente nos EUA, que realizamos a Convenção Estadual de Solidariedade a Cuba, em Ipatinga/MG - 2013. Objetivos gigantescos. Bem menores que a nossa vontade e determinação. Estejam certos.

2. De onde menos se espera, daí é que não sai nada mesmo

Em carta encaminhada ao secretário de Esporte, Cultura e Lazer da Cidade, em 7 de abril, esclarecíamos que os organizadores do evento “Elegem Ipatinga sede preferencial da Convenção, não somente por sua relevante importância política e cultural em nosso Estado, potencial e pretendido pólo de expansão regional do trabalho e organização do Movimento Estadual de Solidariedade à Revolução Cubana; mas, sobretudo, por sermos um município que tem o privilégio de ter pelo menos 3 jovens da cidade estudando medicina em Cuba, em fase final de conclusão de curso”.

Por nosso entendimento de que Ipatinga tem uma dívida de gratidão com o povo Cubano, imaginávamos que a Administração do Município não só apoiasse a Convenção dentro de suas possibilidades, mas que tivesse uma atitude de solidariedade ativa com os organizadores do evento. Vã esperança malograda!

Aqui bom distinguir o comportamento dos servidores daquilo que denomino atitude da instituição. Os servidores, todos sem exceção, foram disponíveis, atenciosos e diligentes. A eles nossos agradecimentos em nome dos organizadores da Convenção. Certo que sem a sua dedicada atenção, nossas dificuldades na organização do Evento teriam sido bem maiores.

Para falar da atitude institucional, não vamos nos alongar. Somente dois sinais. Primeiro, malgrado nossa insistência, a demora na resposta à nossa consulta sobre possibilidades e com que apoio poderíamos contar na realização do evento; carta encaminhada em 7 de abril, resposta somente recebida no dia 3 de maio, ou seja, 26 dias após a entrega da carta de solicitação e a quinze dias do 18 de maio, data de realização do evento. Demora que expressa no mínimo um descuido com as suas conseqüências para os seus organizadores e até mesmo para a realização do Evento, sobretudo quando o apoio, anunciado na ante-véspera, deixava ainda por reunir o fundamental das condições para a realização da conferência, ao mesmo tempo que não deixava aos organizadores alternativa. Não realizar a Convenção era impensável, sem um descomunal desgaste, pois a maioria dos contatos, comprometimento de agenda dos convidados, contratação de serviços, reserva de vôos, material de divulgação, já deveriam estar encaminhados, muitos já concluídos a esta altura do campeonato. O que de fato já estava. Nossa decisão, fazer. Fizemos...

Segundo, recebemos em nossa Cidade o Cônsul da Venezuela no Rio de Janeiro, Senhor Edgar Gonzales Marin e o Cônsul de cuba em São Paulo, Senhor Alexander Quintana Cañete e o Beto Almeida, Representante da Telesur no Brasil. Um representante de uma Importante Televisão, que acredito todos conheçam, mantida por 7 países latino-americanos, liderados pela Venezuela. Dois representantes diplomáticos de duas nações amigas e que enfrentam ameaças que exigem nosso pronunciamento, (Bom lembrar com Castoriadis: nós somos responsáveis pelo que falamos e pelo que calamos, também), e que sequer foram protocolarmente cumprimentados pelos gestores do município. Tratamento não recomendado sequer por cerimonial de qualquer grotão.... A eles em nome de nossa cidade, pedimos nossas desculpas.

Acho que isso é mais que suficiente para esclarecer o que denominei atitude institucional.

Tudo Isso me trouxe à memória que, em 1970, ali pelo fim do ano, o exército uruguaio numa investida contra os Tupamaros, ativo grupo guerrilheiro, prendendo suas principais lideranças, Raul Sendic, baleado entre eles, tinha aparentemente dizimado a Organização. Um jovem Tupamaro, de apenas 22 anos, entrevistado por uma revista internacional, ao ser interrogado se os tupamaros estavam mortos, respondeu com firmeza: Não, aquele que vós matais continuam gozando de ótima saúde! A Convenção foi realizada. Luta que segue.

3. Resoluções da Convenção: Constituir uma Rede de Solidariedade Ativa a Cuba


Aberta, com uma homenagem ao Povo Venezuelano na lembrança do ex-presidente Hugo Chaves. Povo venezuelano que enfrenta nesses dias um violento esforço de desestabilização política, econômica e social. Esforço de construção do caos justificador de um golpe em andamento. Conspiração que integra os esforços de desestabilização dos governos de centro esquerda na América Latina e Caribe. Equador, Bolívia, Cuba e Venezuela, a bola da vez. Desestabilização orquestrada pelo governo Obama, com a intervenção direta da CIA, como nos velhos tempos, com o apoio da direita local, hoje liderada, na Venezuela, por Caprilles, Candidato de oposição à Presidência, derrotado.

A seguir, os debates percorreram os seguintes temas:

1. Análise de Conjuntura : Brasil no contexto internacional
2. A integração solidária Latino-Americana e Caribenha entre os povos
3. A luta permanente contra o bloqueio econômico e as perspectivas da Revolução Cubana
4. A liberação dos cinco heróis cubanos, presos injustamente nos Estados Unidos
5. O combate à campanha midiática internacional contra Cuba: a guerra midiática e a defesa da autodeterminação dos povos.

Entendendo que a solidariedade ao povo cubano passa por nossas lutas diárias, pela criação de uma rede permanente de solidariedade ativa a Cuba, a Convenção tomou as seguintes resoluções que serão levadas ao debate na Convenção Nacional de Solidariedade a Cuba, em junho, em Foz do Iguaçu:

• Usar todos os meios de comunicação à nossa disposição(Sindicatos, Entidades Estudantis, Partidos, Associações de Bairros, Ongs, TVs Comunitárias) para a difusão sistemática de informações sobre Cuba, no sentido de contrastar as informações veiculadas pela mídia privada, pelas grandes redes de comunicação nacionais e internacionais;
• Produção de um texto único com as informações essenciais sobre cuba, sua história e sua situação atual, para a veiculação em nossos meios de comunicação;
• Promoção do debate e da luta pela libertação dos cinco heróis presos em Miami – EUA, em todos os nossos espaços de intervenção e meios de comunicação
• Cobrar do Brasil sua imediata integração à Telesur;
• Fazer gestões junto às TVs e demais órgãos de imprensa públicos, buscando a abertura e ampliação dos espaços destinados a informações sobre a realidade latino-americana, sobretudo sobre a realidade cubana.
• Na luta pela democratização da comunicação: construção e ampliação de órgãos e redes locais de comunicação livre e independente (Jornais, Rádio e TVs Comunitárias) ao mesmo tempo em que nos integramos à iniciativa popular por um marco regulatório democrático para a mídia nacional, lançada pelo Forum Nacional de Democratização da Comunicação-FNDC e as Entidades Sindicais, no último 1° de maio. Ampliar e aprofundar o debate sobre a democratização da informação, colher as 1,3 milhão de assinaturas, quebrar o monopólio das 6 famílias, democratizar o acesso aos recursos públicos e democratizar a decisão sobre sua destinação. Para expressar a Liberdade.

Espero que esse texto ajude na preservação de nossa memória e contribua para seguirmos em frente. A realidade não é nosso limite, a realidade é nosso ponto de partida.

Ipatinga, 21 de maio de 2013.

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