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sexta-feira, 4 de maio de 2012

Cubanos buscam alfabetização climática


Em Cuba, as redes sociais começaram a ter um papel concreto na conscientização ecológica
Fonte: ENVOLVERDE

Tuiteiros dedicam tempo para limpar o Rio Almendares.
Foto: Jorge Luis Baños/IPS
 
Havana, Cuba, 02/05/2012 

O papel da comunidade pode ser fundamental na adaptação à mudança climática, desde que seja preparado adequadamente para compreender e fazer seu o problema. “Falta uma alfabetização” nessa matéria, afirmou Ángela Corvea, promotora ambiental de longa data.

“As pessoas nem sempre levam a sério estes problemas e não têm a percepção de risco diante dos fenômenos naturais, que cada vez serão mais frequentes e severos”, disse Corvea ao responder a uma pergunta sobre o tema feita pelo Café 108, uma iniciativa do site do escritório da IPS em Cuba para propiciar a participação cidadã na pesquisa jornalística.

Em sua opinião, “pequenas ações comunitárias e locais poderiam ajudar a enfrentar estes caminhos que não são iminentes, mas que já estão aí”. Aumento da temperatura e do nível médio do mar, secas recorrentes, inundações e furacões mais intensos figuram entre as eventuais consequências das transformações e variações climáticas.

Criadora em 2003 do projeto ecológico Acualina, para transmitir conhecimentos ambientais “à grandes massas” e especialmente crianças e adolescentes, Corvea organiza, há mais de uma década, um trabalho de saneamento costeiro para contribuir com a campanha multinacional “Limpando o Mundo”, surgida na Austrália.

“É preciso promover a economia de água e outros recursos, consumir só o necessário, não contaminar, tentar manter um entorno limpo e bonito, reciclar, estar informado, ensinar os demais, especialmente crianças e jovens, ser solidário, falar destes temas em qualquer âmbito para chamar a atenção e ir criando consciência”, reitera a incansável ativista.

Enrique Arango, especialista do Centro Nacional de Pesquisas Sismológicas, concorda com Corvea em que os riscos da mudança climática são vistos no longo prazo, o que dificulta criar consciência no plano comunitário. “É como fumar. Ninguém vê o perigo iminente e não deixa o vício mesmo sabendo que o tabagismo faz mal”, apontou. No caso de Cuba é difícil desligar a comunidade do papel centralizado de todas as instâncias políticas e administrativas. “Se não vier de cima (das autoridades), não se faz ou fica inconcluso”, disseram alguns entrevistados e participantes da pesquisa do Café 108.

Segundo Arango, entre as eventuais vias para “alfabetizar” as pessoas em seus bairros e localidades figuram os projetos interativos, nos quais participa uma alta porcentagem da população, mas que exige uma sistematização, liderança e principalmente vontade política em todos os níveis. “Caso contrário, só se terá alguns resultados enquanto o plano estiver em execução”, alertou.

Em Cuba, as redes sociais começaram a ter um papel concreto na conscientização ecológica quando integrantes do Twitter promoveram em dezembro pela internet uma ação de limpeza e educação ambiental na desembocadura do Rio Almendares. “As grandes coisas partem de pequenas coisas. Cada um faz seu pedacinho e se ajuda. No fim, a questão não era só recolher o lixo, mas provocar uma reação, conscientizar a população da região a fazer saneamento e cuidar da parte que lhe toca”, explicou à IPS o tuiteiro Salvatore (@salvatore300).

O líder do grupo de rap Cubanos na Rede, Osmel Francis, promove ações de cuidado e proteção social do entorno a partir de sua arte. “Os cantores nem sempre sabem o quanto podem ser úteis para a sociedade”, declarou à IPS. Nesse caminho, uniu-se a Corvea em jornadas de limpeza do Rio Quibú, um dos mais contaminados de Havana.

Francis acredita que a consciência ambiental é deficiente e a chave para elevá-la é a educação. “Também falta a mídia se envolver mais, porque fazemos campanhas e jornadas ecológicas que nem sempre são divulgadas. Não vejo a questão do meio ambiente entre as prioridades. Sobre adaptação à mudança climática, inclusive nós, ambientalistas, deveríamos receber capacitação, assim saberíamos melhor o que fazer e como chegar com nossa mensagem até as pessoas”, acrescentou.

A esse respeito e com sua experiência como repórter fotográfico, Rolando Pujol comentou que a população deve conhecer melhor os riscos a que se expõe. Costuma haver moradores que insistem em permanecer em áreas de risco porque têm sua vida e seu sustento “estreitamente” vinculados ao mar. Por isso, “prefere reparar uma e outra vez suas casas destruídas” pelos furacões. Some-se a isso as tradições e a história de locais que devem ser reconstruídos em áreas distantes da costa, destacou.

Ramón Pichs, especialista em mudança climática, considera “fundamental” o papel da população nas estratégias de adaptação em Cuba e em todo o resto do Caribe insular. Qualquer projeto terá mais sucesso “se as comunidades tiverem um adequado grau de conscientização com relação aos problemas”, ressaltou.

Em entrevista à IPS, este especialista deu como exemplo a participação ativa da população de Cuba em programas de saúde e campanhas antivetoriais ou no caso do projeto que busca restaurar em Trinidad e Tobago o pântano de Nariva, no qual estão comprometidas várias organizações da sociedade civil e da região.

Para a adaptação, a escala local é fundamental, e, traduzindo isso em ações, o papel da população e das diferentes organizações que têm presença na comunidade, torna-se crucial, enfatizou Pichs, que também considerou muito importante a vinculação desses setores com outras instituições nacionais que cuidam da questão ambiental.

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