sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

Cuba: Só haverá relações migratórias normais com EUA com fim da lei de ajuste cubano

Otdoor em Cuba: A Revolução segue adiante | Foto: Reuters
 Do Opera Mundi

O governo de Cuba declarou nesta quinta-feira (12/01) que o acordo entre o país e os Estados Unidos que põe fim à regra migratória norte-americana especial para cidadãos cubanos é um “importante passo para o avanço das relações bilaterais” entre os dois países, retomada em dezembro de 2014.

Por meio de comunicado (leia abaixo), o governo cubano afirmou que com a declaração conjunta assinada pelo ministro do Interior cubano, Julio César Gandarilla, e pelo chefe da missão dos EUA em Havana, Jeffrey DeLaurentis, “se elimina a comumente conhecida como política ‘Pés secos, pés molhados’ e o programa de admissão provisional (parole) para profissionais cubanos da saúde, que Washington aplicava a terceiros países”.

A regra migratória especial para cubanos, estabelecida em 1995, estipulava que cidadãos deste país que conseguissem tocar terra norte-americana recebiam automaticamente a residência permanente, assim como profissionais de saúde que participassem das missões cubanas em outros países que quisessem emigrar para os EUA.

Tal política “constituía até agora um estímulo à emigração irregular, ao tráfico de emigrantes e às entradas irregulares nos Estados Unidos desde países terceiros de cidadãos cubanos que viajam legalmente ao exterior, e ao admiti-los automaticamente em seu território, lhes conferia um trato preferencial e único que não recebem cidadãos de outros países, e por isso também era uma incitação a saídas ilegais”.

A implementação desta e de outras políticas, segue o governo cubano, “provocou crises migratórias, sequestros de embarcações e aeronaves e o cometimento de delitos como tráfico de emigrantes, tráfico de pessoas, fraude migratória e o uso da violência como um impacto extraterritorial desestabilizador crescente sobre outros países da região, utilizados como trânsito para chegar a território estadunidense”.

De acordo com o estabelecido no novo acordo, a partir deste momento os EUA irão repatriar e Cuba irá receber todos os cidadãos cubanos que “sejam detectados pelas autoridades competentes dos EUA quando tentavam ingressar ou permanecer irregularmente neste país”.

“Os Estados Unidos também se comprometeram a aplicar daqui em diante aos cidadãos cubanos que sejam detectados nesta situação os mesmos procedimentos e normas migratórias aplicadas ao resto dos migrantes de outros países, sem um critério de seletividade, o que é um sinal positivo no propósito de eliminar as exclusividades no caso dos cubanos, que têm um marcado matiz político”, afirmou Havana.

Apesar de celebrar a nova medida, o governo cubano ressaltou que, para “garantir uma migração regular, segura e ordenada, enfrentar com efetividade as ameaças à segurança de ambos os países que derivam da migração irregular e alcançar relações migratórias normais entre Cuba e os EUA, será necessário também que o Congresso estadunidense derrogue a Lei de Ajuste Cubano de 1966, única do tipo no mundo, que não corresponde ao contexto bilateral atual”. Tal lei estabelece o tratamento preferencial a cubanos que cheguem aos EUA, dando autoridade ao procurador-geral norte-americano para, a seu critério, conceder residência permanente no país aos cubanos que entrem no território norte-americano.

Leia comunicado do governo de Cuba, publicado no Granma:
Um importante passo no avanço das relações bilaterais teve lugar nesta quarta-feira, 12 de janeiro com a assinatura de um acordo entre os governos de Cuba e dos Estados Unidos, que entrou em vigor nesse próprio dia, encaminhado a garantir uma migração regular, segura e ordenada.

Com este acordo é eliminada a conhecida comumente como política de “pés secos-pés molhados” e o programa de admissão provisória (parole) para profissionais cubanos da Saúde, que Washington aplicava em terceiros países.

Nos últimos anos, tinha sido um interesse permanente do governo de Cuba adotar um novo acordo migratório com os Estados Unidos, para solucionar os graves problemas que continuavam afetando as relações migratórias, apesar da existência de acordos bilaterais neste âmbito. Pela primeira vez, Cuba formalizou esta proposta, no ano 2002, a qual foi rechaçada pelo governo do presidente George W. Bush. Cuba voltou a apresentar um novo projeto de acordo migratório, em 2009, o qual foi atualizado em 2010 e reiterado mais recentemente, em 30 de novembro de 2015.

Depois de quase um ano de negociação e alentados pelo restabelecimento das relações diplomáticas, em 20 de julho de 2015, baseadas no respeito mútuo e a vontade política de fortalecer esses vínculos e estabelecer novos entendimentos em diversos temas de interesse comum, os governos conseguiram concretizar este compromisso que deve contribuir para a normalização das relações migratórias, as quais têm estado marcadas, desde o triunfo da Revolução, pela aplicação de políticas agressivas nesta matéria, por parte de sucessivas administrações estadunidenses, que alentaram a violência, a migração irregular e o tráfico de pessoas, causando numerosas mortes de inocentes.

O acordo atingido insere-se na disposição de Cuba, ratificada pelo presidente dos Conselhos de Estado e de Ministros, general-de-exército Raúl Castro Ruz, em sua alocução, em 17 de dezembro de 2014, e reiterada em múltiplas ocasiões "de ter com o governo dos Estados Unidos um diálogo respeitoso, baseado na igualdade soberana, para tratar dos mais diversos temas de forma recíproca, sem abrir mão da independência nacional e a autodeterminação de nosso povo, (…) posição que foi expressa ao governo dos Estados Unidos, de forma pública e privada, pelo companheiro Fidel, em diferentes momentos de nossa longa luta, com a proposta de discutir e resolver as diferenças mediante negociações, sem renunciar a um só dos nossos princípios".

Da mesma forma, é coerente com a vontade expressa do governo cubano de, no exercício de sua soberania, atualizar a política migratória vigente e ajustá-la às condições do presente e o futuro previsível, como o demonstrou com a implementação de um grupo importante de medidas, a partir de 14 de janeiro de 2013.

A conhecida comumente como política de "pés secos-pés molhados", uma flagrante violação da letra e o espírito dos acordos migratórios atingidos entre Cuba e os Estados Unidos, em 1994 e 1995, constituía até agora um estímulo à emigração irregular, ao tráfico de emigrantes e às entradas irregulares aos Estados Unidos, a partir de terceiros países, de cidadãos cubanos que viajam legalmente ao exterior, e ao admiti-los automaticamente em seu território, conferia-lhes um tratamento preferencial e único que não recebem cidadãos de outros países, pelo que também era uma incitação às saídas ilegais. Sua implementação e a de outras políticas provocou crises migratórias, sequestros de naves e aeronaves e a comissão de delitos, como o tráfico de emigrantes, o tráfico de pessoas, a fraude migratória e o uso da violência com um impacto extraterritorial desestabilizador crescente sobre outros países da região, utilizados como escalão para chegar ao território estadunidense.

A decisão de eliminar essa política implica que “a partir da data desta Declaração Conjunta, os Estados Unidos da América, consistentes com suas leis e as normas internacionais, devolverão à República de Cuba, e a República de Cuba, consistente com suas leis e as normas internacionais, receberá todos os cidadãos cubanos, os que, posteriormente à assinatura deste acordo, sejam detectados pelas autoridades competentes dos Estados Unidos da América quando tentavam ingressar ou permanecer irregularmente nesse país”, violando suas leis.

Os Estados Unidos também se comprometeram a aplicar, daí em diante, aos cidadãos cubanos que sejam detectados nessa situação, os mesmos procedimentos e normas migratórias do que ao resto dos migrantes de outros países, sem um critério de seletividade, o qual é um sinal positivo no propósito de eliminar as exclusividades no caso dos cubanos, que têm um marcante matiz político.

Igualmente, é eliminado o denominado Programa de Parole para Profissionais Médicos Cubanos, que fazia parte do arsenal para privar o país de médicos, enfermeiros e outros profissionais do setor, em uma virtual operação internacional de roubo de cérebros, promovida pelo governo dos Estados Unidos desde 2006 e um atentado contra as missões médicas humanitárias e solidárias de Cuba nos países do Terceiro Mundo, que tanto necessitam. Esta política incitou o pessoal cubano da Saúde que colabora em terceiros países a abandonar suas missões e emigrar para os Estados Unidos, convertendo-se em uma prática censurável que afetou os programas de cooperação médica internacional de Cuba.

Esses dois obstáculos têm desaparecido neste dia 12 de janeiro, porém para poder ser consequentes com a letra e o espírito desta Declaração Conjunta, garantir uma migração regular, segura e ordenada, enfrentar com efetividade as ameaças à segurança de ambos os países que derivam da migração irregular, e atingir relações migratórias normais entre Cuba e os Estados Unidos, será necessário, também, que o Congresso estadunidense derrogue a Lei de Ajuste Cubano de 1966, única de seu tipo no mundo que não se corresponde com o contexto bilateral atual.

Salvo o disposto por esta Declaração Conjunta, mantêm toda sua vigência os outros acordos migratórios alcançados previamente por Cuba e os Estados Unidos: os Comunicados Conjuntos de 14 de dezembro de 1984 e de 9 de setembro de 1994 e a Declaração Conjunta de 2 de maio de 1995. Entre outros aspectos ratifica-se a decisão de ambas as partes de impedir as saídas ilegais pela via marítima e de devolver a Cuba a todas as pessoas que sejam interceptadas nesses fatos ou aqueles que penetrarem na Base Naval de Guantánamo. O governo dos Estados Unidos continuará garantindo a migração regular a partir de Cuba, com um mínimo de 20 mil pessoas anuais.

Ambos os governos acordaram aplicar suas leis de migração de maneira não seletiva e de conformidade com suas obrigações internacionais. Da mesma forma, comprometeram-se a impedir as saídas arriscadas que põem em perigo a vida humana, prevenir a migração irregular e lutar contra os atos de violência associados a estas manifestações, como o tráfico de pessoas.

Nesse sentido, as partes promoverão a cooperação bilateral eficaz para prevenir, e julgar os envolvidos no tráfico de pessoas, bem como os delitos associados aos movimentos migratórios, que põem em perigo sua segurança nacional, incluindo o sequestro de aeronaves e embarcações. Tudo isso está em correspondência com os avanços alcançados, em curto tempo, na cooperação bilateral em matéria de segurança.

As autoridades competentes dos dois países têm realizado as coordenações pertinentes para garantir a implementação efetiva deste acordo, incluídos os procedimentos operacionais correspondentes entre os órgãos responsáveis por garantir o cumprimento e aplicação da lei, com vista a impedir ações que pretendam embaçar este esforço ou tentem pôr em risco a segurança de ambas as nações.

Fiel às suas obrigações internacionais e a sua legislação, o governo da República de Cuba ratifica seu compromisso de garantir a migração regular, segura e ordenada, bem como cumprir cabalmente este novo acordo para o qual foram tomadas internamente as medidas correspondentes. Continuará garantindo o direito de viajar e emigrar dos cidadãos cubanos e de retornar ao país, de acordo com os requisitos da lei migratória. Ainda, adotará paulatinamente outras medidas para atualizar a política migratória vigente.

Havana, 12 de janeiro de 2017.  

Nenhum comentário:

Postar um comentário